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Em continuidade ao
número 8 do documento intitulado Sacrosanctum Concilium, temos que, além de entender que a Liturgia da qual participamos
aqui é uma antecipação da liturgia celeste; que essa mesma liturgia é lugar de
onde nos dirigimos à Deus, conforme por várias vezes já foi mencionado e que o
documento nada mais faz do que confirmar o que estamos tentando dizer:
8. Pela Liturgia da terra participamos, saboreando-a
já, na Liturgia celeste celebrada na cidade santa de Jerusalém, para a qual,
como peregrinos nos dirigimos e onde Cristo está sentado à direita de Deus
(...)
A Santa Missa se
mostra um caminho que deve ser trilhado por todos nós, entendendo que Cristo é
o Caminho (João 14, 6a) como Ele mesmo já nos disse. Na Santa Missa temos o
sacrifício de Cristo, escândalo para um sem número de pessoas, cristãs ou não,
que nos leva à salvação, afinal, Cristo morreu para nos salvar e abriu o
caminho para que todos nós pudéssemos chegar ao Pai, contudo é preciso querer,
é preciso buscar, é preciso trilhar esse caminho.
(...) por meio dela cantamos ao Senhor um hino de
glória com toda a milícia do exército celestial, esperamos ter parte e comunhão
com os Santos cuja memória veneramos, e aguardamos o Salvador, Nosso Senhor
Jesus Cristo, até Ele aparecer como nossa vida e nós aparecermos com Ele na
glória (23).
Os anjos não à toa
participam da Santa Missa. Ela é o apogeu da adoração divina e toda criatura
deve fazer essa adoração (Filipenses 2, 9-10). Obviamente que o grau de
entendimento dos anjos é muito maior que o grau de entendimento do mais
entendido dos seres humanos, contudo só podemos pagar por aquilo que sabemos e
entendemos. Como diriam alguns: a ignorância salva mais do que qualquer outra
coisa nesse mundo (Atos dos Apóstolos 17, 30).
Algumas passagens
bíblicas são cristalinas para o entendimento da Santa Missa como ela é e como
foi sendo inserida na humanidade desde o princípio.
Desde o início Deus
faz uma aliança com Abraão, então Abrão, o que pode ser lido em Gênese 15,
5-19. A passagem parece estranha e com costumes estranhos aos nossos, porém, ao
ser entendida como um pacto, podemos chegar a algumas conclusões.
Deus diz a Abrão que
lhe dará uma infinita descendência:
E,
conduzindo-o fora, disse-lhe: “Levanta os olhos para os céus e conta as
estrelas, se és capaz... Pois bem, ajuntou ele, assim será a tua descendência.”
(Gênesis 15,5)
Essa era uma promessa divina e certamente seria cumprida,
contudo Abrão, mesmo confiando deixa transparecer uma ponta de dúvida ao
perguntar a Deus:
“O
Senhor Javé, como poderei saber se a hei de possuir?” (Gênesis 15, 8)
Deus, em Sua infinita
misericórdia não leva a pergunta com maus olhos e entende a dúvida de Abrão,
afinal era uma promessa sem precedentes e de uma grandeza sem fim. É preciso
entender que a grandeza dessa promessa não estava somente na quantidade de descendentes,
mas na possibilidade de ter esses descendentes. Nossa sociedade atualmente
parece inverter os papéis e entender que uma grande prole e uma larga
descendência é uma praga, uma espécie de maldição. As pessoas não mais querem
filhos e preferem cachorros e gatos, contudo Abrão e toda a sociedade em que
ele estava inserido não entendia assim, pelo contrário, tinha nessa grande
prole e grande descendência o entendimento de que é uma bênção de Deus, como na
verdade é.
Pois bem, Abrão
considerou essa bênção grande demais e por isso faz a pergunta para Deus
querendo saber como poderá saber se há mesmo de possuir tudo aquilo.
Deus responde com uma
ordem estranha para nossos costumes:
“Toma uma novilha de três anos,
respondeu-lhe o Senhor, uma cabra de três anos, um cordeiro de três anos, uma
rola e um pombinho.” (Gênesis 15, 9)
A ordem de Deus para
Abrão é um tanto quanto estranha, mas muito óbvia para Abrão que não titubeia e
já parte em busca desses animais.
Como podemos perceber,
Abrão já sabia o porque de Deus pedir esses animais e já prepara tudo sem mesmo
que Deus determine algo mais, vejamos:
Abrão tomou todos esses animais, e
dividiu-os pelo meio, colocando suas metades uma defronte da outra; mas não
cortou as aves. (Gênesis 15, 10)
Deus não manda a Abrão
que ele divida os animais ao meio, mas Abrão já faz isso porque já compreendeu
o que Deus pretende.
Era costume da época
que, quando selado um pacto, comercial normalmente, ou uma promessa qualquer
feita entre duas pessoas, se pegasse animais e os partisse ao meio. Os dois
pactuantes passavam entre os animais prometendo que se não cumprirem a promessa
“que aconteça comigo o que aconteceu com esse animal”, ou seja, que morra da
forma mais horrível possível. Tudo porque não cumprir o pacto.
Deus entende esse
costume e Abrão também, por isso esse ritual já é prontamente organizado por
Abrão.
Entretanto, a
sequência dos fatos não acontece exatamente como Abrão esperava, nem como era o
costume. Após uma clara profecia sobre o que aconteceria ao povo de Israel no
Egito, inclusive o êxodo, a Bíblia nos relata o seguinte;
Quando o sol se pôs, formou-se uma
densa escuridão, e eis que um braseiro fumegante e uma tocha ardente passaram
pelo meio das carnes divididas. (Gênesis 15, 17)
Como dissemos, no meio
dos animais divididos deveriam passar aqueles que fazem o pacto, ou seja, no
caso em questão deveriam passar Deus e Abrão. Deus se manifesta por várias
vezes como fogo, como bem sabemos. Existe o episódio da sarça ardente (Êxodo 3,
1-4), também pela invocação de Elias para provar que Deus era único e não
existia nenhum Deus Baal (1Reis 18, 24ss) e outras tantas passagens.
Nesse caso, o fogo,
que era Deus, passou sozinho por entre os animais partidos. O que isso poderia
significar? Ora o significado é por demais óbvio: Deus assume toda a
responsabilidade sozinho. É claro que Deus não descumpriria Sua palavra,
contudo o homem, corrompido pelo pecado original e tendente sempre ao pecado,
certamente descumpriria. Deus assume sozinho a responsabilidade e seria partido
ao meio, ou seja, morto da pior forma, caso houvesse algum descumprimento de
qualquer das partes.
A morte de Cristo nada
mais foi do que o cumprimento dessa promessa e de tantas outras. Nessa promessa
feita com Abrão, Deus se entrega à morte mais horrível não por Seu próprio
descumprimento do que foi pactuado, mas pelo descumprimento da humanidade, isto
é, morre por nós e no nosso lugar.
A morte de Cristo vem
sendo confirmada na história do povo de Israel desde muitos anos antes da vinda
do próprio Cristo e, antes mesmo dessa morte Cristo nos ensina muitas coisas
entre elas a Santa Missa que deve ser celebrada apenas por aqueles que foram
escolhidos e chamados pelo nome, apenas pelos Apóstolos e aqueles que o
sucederem. Trata-se de um mandato divino, algo a ser discutido em outro texto.
É o cumprimento dessa
promessa divina o que celebramos na Santa Missa e é nessa esteira que o altar
se torna Calvário, celebrando a mesma morte de um Deus atemporal em cada Santa
Missa diariamente celebrada em milhares de lugares pelo mundo.
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