terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Sacrosanctum Concilium. Parte Oito. A Liturgia terrena, antecipação da Liturgia celeste.


Outros artigos sobre o CVII:


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Um título perfeito foi o encontrado pelos padres conciliares ao dar cabeçalho ao número 8 do documento Sacrosanctum Concilium de “A Liturgia terrena, antecipação da Liturgia celeste”.

Poucos católicos sabem o que é realmente a Santa Missa, quanto aos demais, sejam protestantes, não cristãos ou até mesmo os que tentam admitir que não creem em nada, apesar de terem em suas teorias um pressuposto de infalibilidade dogmática incontestável, quanto a esses todos, obviamente, que não têm a mínima noção do que seja uma celebração litúrgica, uma vez que sequer conhecem, em sua maioria, a palavra liturgia.

Pois bem, de qualquer forma o católico, ou o que se diz católico, normalmente não tem nem um vislumbre do que vem a ser liturgia, muito menos de que a Santa Missa que é celebrada em diversas igrejas e que pode ser acompanhada por qualquer um de nós, é uma antecipação do que acontecerá após a  nossa morte, caso esse seja o nosso destino após essa vida, claro.

O número 8 do documento assim é redigido:

8. Pela Liturgia da terra participamos, saboreando-a já, na Liturgia celeste celebrada na cidade santa de Jerusalém, para a qual, como peregrinos nos dirigimos e onde Cristo está sentado à direita de Deus, ministro do santuário e do verdadeiro tabernáculo (22); por meio dela cantamos ao Senhor um hino de glória com toda a milícia do exército celestial, esperamos ter parte e comunhão com os Santos cuja memória veneramos, e aguardamos o Salvador, Nosso Senhor Jesus Cristo, até Ele aparecer como nossa vida e nós aparecermos com Ele na glória (23).

O parágrafo é relativamente longo visualmente, mas extremamente estreito para a quantidade de detalhes, conceitos e afirmações importantes que faz. Por esse motivo vamos ter que destrincha-lo deixando para outra oportunidade o estudo de suas demais partes. Vejamos seu início:

“Pela Liturgia da terra participamos, saboreando-a já, na Liturgia celeste celebrada na cidade santa de Jerusalém (...)”

Esse pequeno excerto foi feito para que entendamos uma coisa básica: a Santa Missa não é reunião de pessoas; não é encontro social; não é culto para agradar sentidos humanos manchados pelo pecado original. A Santa Missa é culto agradável a Deus e só a Ele dirigido. A Santa Missa é a antecipação do paraíso.

Para entendermos isso é bom sabermos que existem três partes ou estados da Igreja, todas católicas, claro: Igreja militante, Igreja padecente e Igreja triunfante.

A Igreja militante é a que fazemos parte e que milita aqui nesse mundo buscando a purificação e a aproximação da glória final junto a Deus. A Igreja padecente é aquela que está no purgatório e padece, sofre e purga seus pecados para também, um dia, estar na glória de Deus. Por fim, a Igreja triunfante que é aquele cujos membros já foram salvos e estão junto a Deus no paraíso formando uma grande torcida que silenciosamente intercede por todos nós conforme os preceitos divinos.

São Pio X em seu Catecismo Maior certamente é mais conciso e feliz ao explicar:

146. Onde se encontram os membros da Igreja?
Os membros da Igreja encontram-se parte no Céu, formando a Igreja triunfante; parte no Purgatório, formando a Igreja padecente e parte na terra, formando a Igreja militante.

Por favor, ninguém me acuse de afirmar que a Igreja é divida em três partes independentes, não disse isso em momento algum. Disse que a Igreja é dividida em três partes que melhor podem ser compreendidas como três estados. Essas três partes ou estados compõem, por óbvio uma só Igreja cuja cabeça é única: Cristo. São Pio X também não me deixa solitário nessa explicação e certamente explica com mais clareza em seu Catecismo Maior:

147. Estas diversas partes da Igreja constituem uma só Igreja?
Sim, estas diversas partes da Igreja constituem uma só Igreja e um só corpo, porque têm a mesma cabeça que é Jesus Cristo; o mesmo espírito que as anima e as une e o mesmo fim, que é a felicidade eterna, que uns já estão gozando e que outros esperam.

Justamente por ser militante a Igreja aqui na Terra é também gloriosa, não no mesmo sentido da Igreja que já está no paraíso, a triunfante, mas no sentido de que milita e também tem sua glória. Lembre-se que falamos da Igreja que é gloriosa mesmo aqui sendo militante e não dos seus membros que não são gloriosos, afinal a glória maior ainda está por vir mesmo para a Igreja dos Santos, ou seja, mesmo para a Igreja triunfante, uma vez que ela só atingirá a plenitude da glória quando vier o juízo final e todos aqueles que foram salvos e que Deus chama pelo nome (Is 49,1) farão parte de Seu corpo. Nesse dia a Igreja militante se “unirá” definitivamente à Igreja triunfante e padecente. É pensando assim que temos a Santa Missa como ato de total entrega de Cristo por aquela parcela da humanidade que O aceita e O quer. A Santa Missa passa a ser a antecipação da liturgia celeste quando nos eleva a Deus de tal forma que os anjos aclamam conosco, a uma só voz, o canto do Santo.

É nesse estrito sentido que nos unimos à Igreja triunfante todas as vezes que celebramos a Santa Missa já que, assim, tocamos o céu nesse milagre diário que nos passa desapercebido que é a Santa Missa antecipando o que no futuro esperamos conseguir encontrar nos céus.

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Catequeses do Ano da Fé. Jesus Cristo "mediador e plenitude de toda a Revelação".


PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 16 de Janeiro de 2013


Jesus Cristo "mediador e plenitude de toda a Revelação"

Queridos irmãos e irmãs,

O Concílio Vaticano II, na Constituição sobre a Revelação Divina Dei Verbum, afirma que a verdade íntima de toda a Revelação de Deus resplandece para nós «em Cristo, que é o mediador e ao mesmo tempo a plenitude de toda a Revelação» (n. 2). O Antigo Testamento narra-nos como Deus, depois da criação, não obstante o pecado original e apesar da arrogância do homem ao querer colocar-se no lugar do seu Criador, oferece de novo a possibilidade da sua amizade, sobretudo através da aliança com Abraão, e caminho de um pequeno povo, o povo de Israel, que Ele escolhe não com critérios de poder, mas simplesmente por amor. É uma escolha que permanece um mistério e revela o estilo de Deus, que chama alguns não para excluir os outros, mas para que sirvam de ponto conduzindo para Ele: escolha é sempre eleição pelo outro. Na história do povo de Israel podemos voltar a percorrer as etapas de um longo caminho em que Deus se faz conhecer, se revela e entra na história com palavras e ações. Para esta obra Ele serve-se de mediadores, como Moisés, os Profetas e os Juízes, que comunicam ao povo a sua vontade, recordam a exigência de fidelidade à aliança e mantêm viva a expectativa da realização plena e definitiva das promessas divinas.

E foi precisamente o cumprimento destas promessas que pudemos contemplar no Santo Natal: a Revelação de Deus alcança o seu ápice, a sua plenitude. Em Jesus de Nazaré, Deus visita realmente o seu povo, visita a humanidade de um modo que vai além de todas as expectativas: envia o seu Único Filho; o próprio Deus faz-se homem. Jesus não nos diz algo de Deus, não fala simplesmente do Pai, mas é Revelação de Deus, porque é Deus, e assim revela-nos o rosto de Deus. No Prólogo do seu Evangelho, são João escreve: «Ninguém nunca viu Deus. O Filho único, que está no seio do Pai, foi quem O revelou» (Jo 1, 18).

Gostaria de meditar sobre este «revelar o rosto de Deus». A este propósito são João, no seu Evangelho, recorda-nos um acontecimento significativo que há pouco ouvimos. Aproximando-se da Paixão, Jesus tranquiliza os seus discípulos, convidando-os a não ter medo e a ter fé; depois, instaura um diálogo com eles, no qual fala de Deus Pai (cf. Jo 14, 2-9). Numa certa altura, o apóstolo Filipe pede a Jesus: «Senhor, mostra-nos o Pai e isso basta-nos» (Jo 14, 8). Filipe é muito prático e concreto, e diz também o que nós desejamos dizer: «Queremos ver, mostra-nos o Pai», pede para «ver» o Pai, para ver o seu rosto. A resposta de Jesus não se dirige apenas a Filipe, mas também a nós, e introduz-nos no coração da fé cristológica; o Senhor afirma: «Aquele que me viu, viu também o Pai» (Jo 14, 9). Nesta expressão encerra-se sinteticamente a novidade do Novo Testamento, aquela novidade que apareceu na gruta de Belém: é possível ver Deus, Deus manifestou o seu rosto, é visível em Jesus Cristo.

Em todo o Antigo Testamento está bem presente o tema da «procura do rosto de Deus», o desejo de conhecer esta face, o desejo de ver Deus como Ele é, a tal ponto que o termo hebraico pānîm, que significa «rosto», aparece 400 vezes, das quais 100 se referem a Deus: refere-se a Deus 100 vezes, deseja-se ver o rosto de Deus. E no entanto, a religião judaica proíbe totalmente as imagens, porque Deus não pode ser representado, como ao contrário faziam os povos vizinhos, com a adoração dos ídolos; por conseguinte, com esta proibição de imagens, o Antigo Testamento parece excluir totalmente o «ver» do culto e da piedade. Então, o que significa para o israelita piedoso procurar o rosto de Deus, na consciência de que não pode haver qualquer imagem sua? A pergunta é importante: por um lado, deseja-se dizer que Deus não pode ser reduzido a um objecto, como uma imagem que se toma nas mãos, mas também não se pode pôr algo no lugar de Deus; por outro lado, contudo, afirma-se que Deus tem um rosto, ou seja que é um «Tu» que pode entrar em relação, que não está fechado no seu Céu a olhar do alto a humanidade. Sem dúvida, Deus está acima de todas as coisas, mas dirige-se a nós, ouve-nos, vê-nos, fala-nos, faz uma aliança e é capaz de amar. A história da salvação é a história de Deus com a humanidade, é a história desta relação de Deus que se revela progressivamente ao homem, que se faz conhecer a si mesmo, o seu rosto.

Precisamente no início do ano, no dia 1 de Janeiro, ouvimos na liturgia a linda prece de bênção sobre o povo: «O Senhor te abençoe e te guarde! O Senhor te mostre a sua face e te conceda a sua graça! O Senhor dirija o seu rosto para ti e te dê a paz!» (Nm 6, 24-26). O esplendor do rosto divino é a fonte da vida, é aquilo que permite ver a realidade; a luz da sua face é a guia da vida. No Antigo Testamento existe uma figura à qual está ligado de modo totalmente especial o tema do «rosto de Deus»; trata-se de Moisés, Aquele que Deus escolhe para libertar o povo da escravidão do Egito, para lhe confiar a Lei da aliança e para o guiar rumo à Terra prometida. Pois bem, no capítulo 33 do Livro do Êxodo afirma-se que Moisés tinha uma relação estreita e confidencial com Deus: «O Senhor entretinha-se com Moisés face a face, como um homem que fala com o seu amigo» (v. 11). Em virtude desta confidência, Moisés pede a Deus: «Mostrai-me a vossa glória!», e a resposta de Deus é clara: «Farei passar diante de ti todo o meu esplendor, e pronunciarei diante de ti o nome do Senhor... Mas não poderás ver a minha face, pois o homem não me poderia ver e continuar a viver... Eis um lugar perto de mim... ver-me-ás só de costas. Quanto à minha face, ela não pode ser vista» (vv. 18-23). Então, por um lado há o diálogo face a face como entre amigos, mas por outro há a impossibilidade de ver nesta vida o rosto de Deus, que permanece escondido; a visão é limitada. Os Padres afirmam que estas palavras, «ver-me-ás só de costas», querem dizer: só podes seguir Cristo e, seguindo-o, vês de costas o mistério de Deus; Deus só pode ser seguindo vendo-o de costas.

Porém, mediante a Encarnação acontece algo completamente novo. A busca do rosto de Deus passa por uma transformação inimaginável, porque agora é possível ver este rosto: é o rosto de Jesus, do Filho de Deus que se faz homem. Nele encontra cumprimento o caminho de Revelação de Deus, encetado com a chamada de Abraão, Ele é a plenitude desta Revelação porque é o Filho de Deus e, ao mesmo tempo, «mediador e plenitude de toda a Revelação» (Constituição dogmática Dei Verbum, 2), e nele o conteúdo da Revelação e o Revelador coincidem. Jesus mostra-nos o rosto de Deus e faz-nos conhecer o nome de Deus. Na Oração sacerdotal, na Última Ceia, Ele diz ao Pai: «Manifestei o teu nome aos homens... Manifestei-lhes o teu nome» (cf. Jo 17, 6.26). A expressão «nome de Deus» significa Deus como Aquele que está presente no meio dos homens. A Moisés, junto da sarça ardente, Deus tinha revelado o seu nome, ou seja, tornou-se invocável, lançou um sinal concreto do seu «estar» no meio dos homens. Tudo isto, em Jesus, tem o seu cumprimento e plenitude: Ele inaugura de um modo novo a presença de Deus na história, pois quem O vê, vê o Pai, como diz a Filipe (cf. Jo 14, 9). O Cristianismo — afirma são Bernardo — é a «religião da Palavra de Deus»; e não de «uma palavra escrita e muda, mas do Verbo encarnado e vivo» (Hom. super missus est, IV, 11: PL 183, 86b). Na tradição patrística e medieval utiliza-se uma fórmula particular para expressar esta realidade: afirma-se que Jesus é o Verbum abbreviatum (cf. Rm 9, 28, com referência a Is 10, 23), o Verbo abreviado, a Palavra breve, abreviada e substancial do Pai, que nos disse tudo dele. Em Jesus, toda a Palavra está presente.

Em Jesus, também a mediação entre Deus e o homem encontra a sua plenitude. No Antigo Testamento existe um exército de figuras que desempenharam esta função, de modo particular Moisés, o libertador, o guia, o «mediador» da aliança, como o define também o Novo Testamento (cf. Gl 3, 19; Act 7, 35; Jo 1, 17). Jesus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, não é simplesmente um dos mediadores entre Deus e o homem, mas é «o Mediador» da nova e eterna aliança (cf. Hb 8, 6; 9, 15; 12, 24); «Porque há um só Deus — diz são Paulo — e há um sómediador entre Deus e os homens: Jesus Cristo, homem» (1 Tm 2, 5; cf. Gl 3, 19-20). Nele nós vemos e encontramos o Pai; nele podemos invocar Deus com o nome de «Abá, Pai»; nele é-nos conferida a salvação.

O desejo de conhecer Deus realmente, ou seja, de ver o rosto de Deus, está ínsito em cada homem, inclusive nos ateus. E nós talvez tenhamos, de modo inconsciente, este desejo de ver simplesmente quem Ele é, o que Ele é, quem é Ele para nós. Mas este desejo só se realiza seguindo Cristo, porque assim O vemos de costas e enfim vemos também Deus como amigo, a sua face no rosto de Cristo. O importante é que sigamos Cristo não apenas no momento em que temos necessidade, e quando encontramos um espaço nas nossas ocupações diárias, mas com toda a nossa vida enquanto tal. Toda a nossa existência deve ser orientada para o encontro com Jesus Cristo, para o amor por Ele; e, nela, um lugar central deve ser ocupado também pelo amor ao próximo, aquele amor que, à luz do Crucificado, nos faz reconhecer o rosto de Jesus no pobre, no frágil e no sofredor. Isto só é possível se o verdadeiro rosto de Jesus se tornar familiar para nós na escuta da sua Palavra, no falar interiormente, no entrar nesta Palavra, de maneira que deveras O encontremos, e naturalmente no Mistério da Eucaristia. No Evangelho de são Lucas é significativo o trecho dos dois discípulos de Emaús, que reconhecem Jesus na fracção do pão, mas preparados pelo caminho com Ele, preparados pelo convite que lhe apresentaram, de permanecer com eles, preparados pelo diálogo que fez arder o peito deles; assim, no final, eles vêem Jesus. Também para nós a Eucaristia é a grande escola na qual aprendemos a ver o rosto de Deus, entramos em relação íntima com Ele; e aprendemos, ao mesmo tempo, a dirigir o olhar para o momento derradeiro da história, quando Ele nos saciar com a luz do seu rosto. Na terra, nós caminhamos rumo a esta plenitude, na expectativa jubilosa de que se cumpra realmente o Reino de Deus. Obrigado!


Saudação

Uma saudação cordial aos peregrinos de língua portuguesa, nomeadamente ao grupo de «Cantorias», da Diocese de Viseu: me quisestes recordar em vosso canto. Agradeço-vos e, de bom grado, vos encorajo na consagração à Virgem Maria para um feliz êxito na vossa configuração a Cristo. Desçam sobre vós e vossas famílias as Bênçãos de Deus. Obrigado.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

POLITICAMENTE CORRETO. ESTADO LAICO NÃO É ESTADO ATEU.


*Artigo publicado originalmente no jornal Folha de S. Paulo do dia 26 de novembro de 2012.





No Consultor Jurídico, leio artigo de Lenio Streck, eminente constitucionalista gaúcho. Ele, até com certa ironia e um misto de humor britânico e local, destrói todos os argumentos da pretensão de membro do Ministério Público que impôs ao Banco Central 20 dias para retirar das cédulas do real a expressão "DEUS SEJA LOUVADO".

Concordo com todos seus argumentos. Lembro que o referido procurador deveria também sugerir aos constituintes derivados, que são todos os parlamentares brasileiros (513 deputados e 81 senadores), que retirassem do preâmbulo da Constituição a expressão "nós, os representantes do povo brasileiro, sob a proteção de Deus, promulgamos esta Constituição".

Creio, todavia, que por ser preâmbulo da lei suprema, é imodificável. Terá o probo representante do parquet de suportar a referência ao Senhor.

Aliás, é bom lembrar que, sob a proteção de Deus, a Constituição promulgada permitiu que, pelos artigos 127 a 132, tivesse o Ministério Público as relevantes funções que recebeu e que ensejaram ao digno procurador ingressar com a ação anticlerical.

Tem-se confundido Estado laico com Estado ateu.

Estado laico é aquele em que as instituições religiosas e políticas estão separadas, mas não é um Estado em que só quem não tem religião tem o direito de se manifestar.

Não é um Estado em que qualquer manifestação religiosa deva ser combatida, para não ferir suscetibilidades de quem não acredita em Deus.

Há algum tempo, a Folha publicou pesquisa mostrando que a esmagadora maioria da população brasileira, mesmo daquela que não tem religião, diz acreditar em Deus, sendo muito pequeno o número dos que negam sua existência.

Na concepção dos que entendem que num Estado laico, sinônimo para eles de Estado ateu, só os que não acreditam no criador é que podem definir as regras de convivência, proibindo qualquer manifestação contrária ao seu ateísmo ou agnosticismo.

Isso seria uma autêntica ditadura da minoria contra a vontade da esmagadora maioria da população.

Deveria, inclusive, por coerência, o procurador mencionado pedir a supressão de todos os feriados religiosos, a partir do maior deles, o Natal.

Deveria pedir a mudança de todos os nomes de cidades que têm santos como patronos e destruir todos os símbolos que lembrassem qualquer invocação religiosa, como uma das sete maravilhas do mundo moderno, o Cristo Redentor, para não criar constrangimentos à minoria que não acredita em Deus.

O que me preocupa nesta onda do "politicamente correto" é a revisão que se pretende fazer de todo o passado de nossa civilização, desde livros de Monteiro Lobato às epístolas de São Paulo — não ficando imunes filósofos como Aristóteles, Platão ou Sócrates, que elogiavam uma democracia elitista servida por escravos.

Talvez o presidente Sarney tenha resumido com propriedade a ação do eminente membro do parquet ao dizer que, com tantos problemas que deve a instituição enfrentar, deveria ter mais o que fazer.

A moeda padrão do mundo, que é o dólar, tem como inscrição "In God We Trust".

A diferença é que os americanos confiam em Deus e na sua moeda — nós "louvamos a Deus" na esperança de que também possamos confiar na nossa.

Ives Gandra da Silva Martins é advogado tributarista, professor emérito das Universidades Mackenzie e UniFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, é presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo, do Centro de Extensão Universitária e da Academia Paulista de Letras.

Revista Consultor Jurídico, 26 de novembro de 2012.

quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Cronologia da podridão petista


1985 - O PT é CONTRA a eleição de Tancredo Neves e EXPULSA os deputados que votaram nele.
1988 - O PT vota CONTRA a Nova Constituição que mudou o rumo do Brasil.
1989 - O PT DEFENDE O NÃO PAGAMENTO da dívida brasileira, o que transformaria o Brasil num CALOTEIRO MUNDIAL.
1993 - Presidente Itamar Franco convoca todos os partidos para um governo de coalizão pelo bem do país. O PT foi CONTRA e não participou.
1994 - O PT vota CONTRA O PLANO REAL e diz que a medida é eleitoreira.
1996 - O PT vota CONTRA a REELEIÇÃO. Hoje defende.
1998 - O PT vota CONTRA a PRIVATIZAÇÃO DA TELEFONIA, medida que hoje nos permite ter acesso a internet e mais de 150 MILHÕES DE LINHAS TELEFÔNICAS.
1999 - O PT vota CONTRA a adoção do CÂMBIO FLUTUANTE.
1999 - O PT vota CONTRA a ADOÇÃO das METAS DE INFLAÇÃO.
2000 - O PT luta FEROZMENTE CONTRA a criação da LEI DA RESPONSABILIDADE FISCAL, que obriga os governantes a gastarem apenas o que arrecadarem, ou seja, o óbvio que não era feito no Brasil.
2001 - O PT vota CONTRA a criação dos PROGRAMAS SOCIAIS no governo FERNANDO HENRIQUE CARDOSO: Bolsa Escola, Vale Alimentação, Vale Gás, PETI e outras bolsas são classificadas como ESMOLAS ELEITOREIRAS e insuficientes.

Quase toda estrutura sócio-econômica do Brasil foi construída no período listado acima. O PT foi contra tudo e contra todos.

Hoje roubaram os avanços que os outros partidos promoverame pousam como os únicos construtores de um país democrático.

Já que o PT foi contra tudo e contra todos desde a sua fundação, fica uma pergunta para que os leitores respondam: Em 10 anos de governo, quais as reformas que o PT promoveu no Brasil para mudar o que os seus antecessores deixaram?

http://movimentobrasildeverdade.com/cronologia-da-podridao-petista/

sábado, 16 de fevereiro de 2013

Catequeses do Ano da Fé. Fez-se homem


PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 9 de Janeiro de 2013

Fez-se homem

Queridos irmãos e irmãs,

Neste tempo natalício, voltamos a meditar mais uma vez sobre o grande mistério de Deus que desceu do seu Céu para entrar na nossa carne. Em Jesus, Deus encarnou-se, tornou-se homem como nós e assim abriu-nos o caminho para o seu Céu, rumo à plena comunhão com Ele.

Nestes dias, nas nossas igrejas ressoou inúmeras vezes o termo «Encarnação» de Deus, para expressar a realidade que celebramos no Santo Natal: o Filho de Deus fez-se homem, como recitamos no Credo. Mas o que significa esta palavra central para a fé cristã? Encarnação deriva do latim «incarnatio». Santo Inácio de Antioquia — no final do primeiro século — e, acima de tudo, santo Ireneu, utilizaram este termo, meditando acerca do Prólogo do Evangelho de são João, de modo particular sobre a expressão: «O Verbo fez-se carne» (Jo 1, 14). Aqui, a palavra «carne», em conformidade com o uso hebraico, indica o homem na sua integridade, o homem todo, mas precisamente sob o aspecto da sua caducidade e temporalidade, da sua pobreza e contingência. Isto, para nos dizer que a salvação trazida por Deus que se fez carne em Jesus de Nazaré atinge o homem na sua realidade concreta e em qualquer situação em que se encontre. Deus assumiu a condição humana para a purificar de tudo aquilo que a separa dele, para nos permitir chamá-lo, no seu Filho Unigênito, com o nome «Abá, Pai» e assim ser verdadeiramente filhos de Deus. Santo Ireneu afirma: «Este é o motivo pelo qual o Verbo se fez homem, e o Filho de Deus, Filho do homem: para que o homem, entrando em comunhão com o Verbo e recebendo assim a filiação divina, se tornasse filho de Deus» (Adversus haereses, 3, 19, 1: PG 7, 939; cf.Catecismo da Igreja Católica, n. 460).

«O Verbo fez-se carne» é uma daquelas verdades com as quais estamos tão habituados que já quase não nos impressiona pela grandeza do acontecimento que ela exprime. E efetivamente neste período natalício, durante o qual tal expressão volta com frequência na liturgia, às vezes prestamos mais atenção aos aspectos exteriores, às «cores» da festa, do que ao coração da grandiosa novidade cristã que celebramos: algo absolutamente impensável, que só Deus podia realizar, e no qual podemos entrar só mediante a fé. O Logos, que está em Deus, o Logos que é Deus, o Criador do mundo (cf. Jo 1, 1), por Quem foram criadas todas as coisas (cf. 1, 3), que acompanhou e acompanha os homens na história com a sua luz (cf. 1, 4-5; 1, 9), torna-se um no meio dos outros, adquire morada entre nós, torna-se um de nós (cf. 1, 14). O Concílio Ecumênico Vaticano II afirma: «O Filho de Deus... Trabalhou com mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornou-se verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, excepto no pecado» (Constituição Gaudium et spes, 22). Então, é importante recuperar a reverência diante deste mistério, deixar-se envolver pela grandeza deste acontecimento: Deus, o Deus verdadeiro, Criador de tudo, percorreu como homem as nossas estradas, entrando no tempo do homem, para nos comunicar a sua própria vida (cf. 1 Jo 1, 1-4). E fê-lo não com o esplendor de um soberano que com o seu poder submete o mundo, mas com a humildade de um menino.

Gostaria de frisar um segundo elemento. No Santo Natal geralmente trocamos alguns dons com as pessoas mais próximas. Às vezes pode ser um gesto feito por convenção, mas em geral exprime carinho, é um sinal de amor e de estima. Na oração sobre o ofertório da Missa da noite da solenidade do Natal, a Igreja reza assim: «Aceitai, ó Pai, a nossa oferta nesta noite de luz, e através deste misterioso intercâmbio de dons, transformai-nos em Cristo vosso Filho, que elevou o homem ao seu lado na glória». Por conseguinte, o pensamento da doação está no centro da liturgia e na nossa consciência evoca o dom originário do Natal: naquela noite santa Deus, fazendo-se carne, quis entregar-se pelos homens, doou-se a si mesmo por nós; Deus ofereceu-nos o seu único Filho, assumiu a nossa humanidade para nos conferir a sua divindade. Este é o grande dom. Também no nosso doar não é importante que um presente seja caro ou não; quem não consegue doar um pouco de si mesmo, doa sempre muito pouco; aliás, às vezes procura-se precisamente substituir o coração e o compromisso de doação de si mesmo com o dinheiro, com coisas materiais. O mistério da Encarnação indica que Deus não fez assim: não concedeu algo, mas doou-se a si mesmo no seu Filho Unigênito. Encontremos aqui o modelo do nosso doar, a fim de que os nossos relacionamentos, especialmente os mais importantes, sejam guiados pela gratuidade do amor.

Gostaria de oferecer uma terceira reflexão: o acontecimento da Encarnação, de Deus que se faz homem como nós, que nos mostra o realismo inaudito do amor divino. Com efeito, o agir de Deus não se limita às palavras, aliás, poderíamos dizer que Ele não se contenta com falar, mas insere-se na nossa história e assume sobre si a dificuldade e o peso da vida humana. O Filho de Deus fez-se verdadeiramente homem, nasceu da Virgem Maria, numa época e num lugar determinados, em Belém, durante o reino do imperador Augusto, sob o governador Quirino (cf. Lc 2, 1-2); cresceu no seio de uma família, teve amigos, formou um grupo de discípulos, instruiu os apóstolos para dar continuidade à sua missão e terminou o curso da sua vida terrena na cruz. Este modo de agir de Deus é um forte estímulo a interrogar-nos sobre o realismo da nossa fé, que não se deve limitar à esfera do sentimento, das emoções deve entrar no concreto da nossa existência, ou seja, deve referir-se à nossa vida de todos os dias e orientá-la inclusive de modo prático. Deus não se limitou às palavras, mas indicou-nos como viver, compartilhando a nossa própria experiência, excepto no pecado. O Catecismo de são Pio X, que alguns de nós estudaram quando eram jovens, com a sua essencialidade, à pergunta: «O que devemos fazer para viver segundo Deus?», dá esta resposta: «Para viver segundo Deus, devemos acreditar nas verdades reveladas por Ele e observar os seus mandamentos com a ajuda da sua graça, que se obtém mediante os sacramentos e a oração». A fé tem um aspecto fundamental, que diz respeito não só à mente e ao coração, mas à nossa vida inteira.

Proponho um último elemento à vossa reflexão. São João afirma que o Verbo, o Logos, estava em Deus desde o princípio, e que tudo foi feito através do Verbo e nada do que existe foi criado sem Ele (cf. Jo 1, 1-3). O evangelista alude claramente à narração da criação, que se encontra nos primeiros capítulos do Livro do Gênesis, relendo-o à luz de Cristo. Este é um critério fundamental na leitura cristã da Bíblia: o Antigo e o Novo Testamento devem ser lidos sempre juntos, e é a partir do Novo que se revela o sentido mais profundo também do Antigo. Aquele mesmo Verbo que existe desde sempre em Deus, que é Ele mesmo Deus e por meio do qual e em vista do qual tudo foi criado (cf. Cl 1, 16-17), fez-se homem: o Deus eterno e infinito imergiu-se na finitude humana, na sua criatura, para reconduzir a Ele o homem e a criação inteira. O Catecismo da Igreja Católica afirma: «A primeira criação encontrou o seu sentido e apogeu na nova criação em Cristo, cujo esplendor ultrapassa o da primeira» (n. 349). Os Padres da Igreja compararam Jesus com Adão, a ponto de o definir «segundo Adão», ou o Adão definitivo, a imagem perfeita de Deus. Com a Encarnação do Filho de Deus tem lugar uma nova criação, que oferece a resposta completa à interrogação: «Quem é o homem?». Só em Jesus se manifesta completamente o desígnio de Deus sobre o ser humano: Ele é o homem definitivo, segundo Deus. O Concílio Vaticano II reitera com vigor: «Na realidade, só no mistério do Verbo Encarnado é que se esclarece verdadeiramente o mistério do homem... Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a sua vocação sublime» (Constituição Gaudium et spes, 22; cf. Catecismo da Igreja Católica, n. 359). Naquele menino, o Filho de Deus contemplado no Natal, podemos reconhecer a verdadeira face, não apenas de Deus, mas o rosto autêntico do ser humano; e só abrindo-nos à acção da sua graça e procurando segui-lo todos os dias, realizamos o desígnio de Deus sobre nós, sobre cada um de nós.

Caros amigos, neste período meditemos sobre a grande e maravilhosa riqueza do Mistério da Encarnação, para permitir que o Senhor nos ilumine e nos transforme cada vez, à imagem do seu Filho que por nós se fez homem.


Saudação

Uma cordial saudação a todos os peregrinos de língua portuguesa, a quem agradeço a presença e desejo a riqueza imensa e inesgotável que é Cristo, o Deus feito homem. Revesti-vos de Cristo! E, com Ele, o vosso Ano Novo não poderá deixar de ser feliz. Sobre vós e vossas famílias, desça a minha Bênção.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Catequeses do Ano da Fé. Foi concebido por obra do Espírito Santo.


PAPA BENTO XVI
AUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 2 de Janeiro de 2013


Foi concebido por obra do Espírito Santo

Queridos irmãos e irmãs,

O Natal do Senhor ilumina mais uma vez com a sua luz as trevas que muitas vezes envolvem o nosso mundo e nosso coração, e traz esperança e alegria. De onde vem esta luz? Da gruta de Belém, onde os pastores encontraram «Maria, José e o Menino, deitado na manjedoura» (Lc 2, 16). Diante desta Sagrada Família surge uma interrogação mais profunda: como pode aquele Menino pequenino e frágil ter trazido uma novidade tão radical ao mundo, a ponto de mudar o curso da história? Existe porventura algo de misterioso na sua origem, que vai mais além daquela gruta?

Assim, reemerge sempre de novo a interrogação sobre a origem de Jesus, a mesma que é feita pelo Procurador Pôncio Pilatos durante o processo: «De onde és Tu?» (Jo 19, 9). E no entanto, trata-se de uma origem bem clara. No Evangelho de João, quando o Senhor afirma: «Eu sou o pão que desceu do céu», os judeus reagem murmurando: «Não é porventura Ele Jesus, filho de José, de quem conhecemos o pai e a mãe? Portanto, como é que diz agora: “Desci do Céu?”» (Jo 6, 42). E, pouco mais tarde, os cidadãos de Jerusalém opõem-se vigorosamente diante da presumível messianidade de Jesus, afirmando que se sabe bem «de onde Ele é; Mas o Messias, ao contrário, quando vier, ninguém saberá de onde é» (Jo 7, 27). O próprio Jesus faz notar como é inadequada a pretensão deles de conhecer a Sua origem, e deste modo já oferece uma orientação para saber de onde Ele provém: «Não vim de mim mesmo; mas Aquele que me enviou, e que vós não conheceis, Ele é verdadeiro» (Jo 7, 28). Sem dúvida, Jesus é originário de Nazaré, nasceu em Belém, mas que se sabe da sua verdadeira origem?

Nos quatro Evangelhos sobressai claramente a resposta à pergunta «de onde» vem Jesus: a sua verdadeira origem é o Pai, Deus; Ele provém totalmente d’Ele, de uma maneira diversa de qualquer profeta ou enviado de Deus que o tenha precedido. Esta origem do mistério de Deus, “que ninguém conhece”, está contida já nas narrações da infância, nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, que estamos a ler neste tempo de Natal. O arcanjo Gabriel anuncia: «O Espírito Santo descerá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra. Por isso mesmo é que o Santo que vai nascer há-de chamar-se Filho de Deus» (Lc 1, 35). Nós repetimos estas palavras cada vez que recitamos o Credo, a Profissão de fé: «Et incarnatus est de Spiritu Sancto, ex Maria Virgine», «encarnou-se no seio da Virgem Maria por obra do Espírito Santo». Diante desta frase ajoelhamo-nos porque o véu que ocultava é, por assim dizer, desvelado e o seu mistério insondável e inacessível nos toca: Deus torna-se o Emanuel, «o Deus connosco». Quando ouvimos as Missas compostas pelos grandes mestres da música sacra, penso por exemplo na Missa da Coroação, de Mozart, observamos imediatamente como eles fazem uma pausa de maneira particular nesta frase, como se quisessem procurar expressar com a linguagem universal da música aquilo que as palavras não conseguem manifestar: o grandioso mistério de Deus que se encarna, que se faz homem.

Se considerarmos atentamente a expressão «encarnou-se no seio da Virgem Maria por obra do Espírito Santo», descobrimos que ela inclui quatro sujeitos em acção. De modo explícito, são mencionados o Espírito Santo e Maria, mas está também subentendido «Ele», ou seja o Filho, que se fez carne no seio da Virgem, Na Profissão de fé, o Credo, Jesus é definido com diversos apelativos: «Senhor... Cristo, Filho unigênito de Deus... Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro do Deus verdadeiro... da mesma substância do Pai» (Credo niceno-constantinopolitano). Em seguida, damo-nos conta que «Ele» remete para outra Pessoa, o Pai. Por conseguinte, o primeiro sujeito desta frase é o Pai que, com o Filho e com o Espírito Santo, é o único Deus.

Esta afirmação do Credo não diz respeito ao ser eterno de Deus, mas fala-nos sobretudo de uma acção na qual participam as três Pessoas divinas e que se realiza «ex Maria Virgine». Sem ela, a entrada de Deus na história da humanidade não teria alcançado a sua finalidade e não se teria realizado aquilo que é central na nossa Profissão de fé: Deus é um Deus connosco. Assim, Maria pertence de modo irrenunciável à nossa fé no Deus que age, que entra na história. Ela põe à disposição toda a sua pessoa, «aceita» tornar-se lugar da morada de Deus.

Às vezes, também no caminho e na vida de fé, nós podemos sentir a nossa pobreza, a nossa inadequação perante o testemunho a oferecer ao mundo. Todavia, Deus escolheu precisamente uma mulher humilde, num povoado desconhecido, numa das províncias mais remotas do grande império romano. Sempre, mesmo no meio das dificuldades mais árduas a enfrentar, devemos ter confiança em Deus, renovando a fé na sua presença e na sua acção da nossa história, assim como na de Maria. Para Deus nada é impossível! Com Ele, a nossa existência caminha sempre num terreno seguro e está aberta a um futuro de esperança firme.

Professando no Credo: «Encarnou-se no seio da Virgem Maria por obra do Espírito Santo», nós afirmamos que o Espírito Santo, como força do Deus Altíssimo, realizou de forma misteriosa na Virgem Maria a concepção do Filho de Deus. O evangelista Lucas cita as palavras do arcanjo Gabriel: «O Espírito descerá sobre ti e a força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra» (1, 35). Duas evocações são evidentes: a primeira é no momento da criação. No início do Livro do Génesis lemos que «o Espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas» (1, 2); é o Espírito criador que deu vida a todas as coisas e ao ser humano. Aquilo que aconteceu em Maria, através da obra do mesmo Espírito divino, é uma nova criação: Deus, que do nada chamou o ser, mediante a Encarnação dá agora vida a um novo início da humanidade. Os Padres da Igreja falam diversas vezes de Cristo como do novo Adão, para sublinhar o início da nova criação a partir do nascimento do Filho de Deus no seio da Virgem Maria. Isto leva-nos a meditar sobre o modo como a fé traz, também a nós, uma novidade tão vigorosa, a ponto de produzir um segundo nascimento. Com efeito, no início do nosso ser cristãos está o Baptismo, que nos faz renascer como filhos de Deus, que nos faz participar na relação filial que Jesus tem com o Pai. E gostaria de observar que nós recebemos o Baptismo, ou seja, nós «somos baptizados» — é um passivo — porque ninguém é capaz de se tornar filho de Deus sozinho: trata-se de uma dádiva que nos é conferida gratuitamente. São Paulo evoca esta filiação adoptiva dos cristãos numa passagem central da sua Carta aos Romanos, onde escreve: «Na verdade, todos aqueles que são movidos pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Porquanto, vós não recebestes um espírito de escravidão para voltardes a cair no temor; recebestes, pelo contrário, um espírito de adoção pelo qual chamamos: “Abá! Pai!”. O próprio Espírito dá testemunho, em união com o nosso espírito, de que somos filhos de Deus» (8, 14-16). Só abrindo-nos à obra de Deus, como Maria, e confiando a nossa vida ao Senhor como a um amigo em quem temos uma confiança total, é que tudo mudará, a nossa vida há-de adquirir um novo sentido e um novo rosto: o de filhos de um Pai que nos ama e nunca nos abandona.

Falamos de dois elementos: o primeiro é o Espírito, sobre a superfície das águas, o Espírito Criador; mas há um segundo elemento nas palavras da Anunciação. O arcanjo diz a Maria: «A força do Altíssimo estenderá sobre ti a sua sombra». Trata-se de uma evocação da nuvem santa que, durante o caminho do êxodo, pairava sobre a tenda do encontro, sobre a arca da aliança, que o povo de Israel levava consigo, e que indicava a presença de Deus (cf. Êx 40, 34-38). Portanto, Maria é a nova tenda santa, a nova arca da aliança: mediante o seu «sim» às palavras do arcanjo, Deus recebe uma morada neste mundo, Aquele que o universo inteiro não pode conter adquire morada no ventre de uma virgem.

Então, voltemos à questão da qual partimos, a propósito da origem de Jesus, resumida, pela pergunta de Pilatos: «De onde és Tu?». Das nossas reflexões aparece claramente, desde o início dos Evangelhos, qual é a verdadeira origem de Jesus: Ele é o Filho Unigênito do Pai, Ele vem de Deus. Estamos diante do grande e extraordinário mistério que celebramos neste tempo de Natal: por obra do Espírito Santo, o Filho de Deus encarnou-se no seio da Virgem Maria. Trata-se de um anúncio que ressoa sempre novo e que traz consigo esperança e alegria ao nosso coração, porque nos dá a certeza de que, não obstante muitas vezes nos sintamos frágeis, pobres e incapazes diante das dificuldades e do mal do mundo, contudo o poder de Deus age sempre e realiza maravilhas precisamente na debilidade. A sua graça é a nossa força (cf. 2 Cor 12, 9-10). Obrigado!


Saudações

A minha saudação amiga para todos os peregrinos de língua portuguesa, desejando que a luz do Salvador divino resplandeça intensamente nos vossos corações, para serdes semeadores de esperança e construtores de paz nas vossas famílias e comunidades. Com estes votos de um Ano Novo sereno e feliz para todos, de coração vos abençoo.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

MENSAGEM DE BENTO XVI PARA A QUARESMA DE 2013.


MENSAGEM DE SUA SANTIDADE BENTO XVI
PARA A QUARESMA DE 2013
 

Crer na caridade suscita caridade  
«Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele» (
1 Jo 4, 16)  

Queridos irmãos e irmãs!

A celebração da Quaresma, no contexto do Ano da fé, proporciona-nos uma preciosa ocasião para meditar sobre a relação entre fé e caridade: entre o crer em Deus, no Deus de Jesus Cristo, e o amor, que é fruto da acção do Espírito Santo e nos guia por um caminho de dedicação a Deus e aos outros.

1. A fé como resposta ao amor de Deus

Na minha primeira Encíclica, deixei já alguns elementos que permitem individuar a estreita ligação entre estas duas virtudes teologais: a fé e a caridade. Partindo duma afirmação fundamental do apóstolo João: «Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele» (1 Jo 4, 16), recordava que, «no início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo. (...) Dado que Deus foi o primeiro a amar-nos (cf. 1 Jo 4, 10), agora o amor já não é apenas um “mandamento”, mas é a resposta ao dom do amor com que Deus vem ao nosso encontro» (Deus caritas est1). A fé constitui aquela adesão pessoal - que engloba todas as nossas faculdades - à revelação do amor gratuito e «apaixonado» que Deus tem por nós e que se manifesta plenamente em Jesus Cristo. O encontro com Deus Amor envolve não só o coração, mas também o intelecto: «O reconhecimento do Deus vivo é um caminho para o amor, e o sim da nossa vontade à d’Ele une intelecto, vontade e sentimento no acto globalizante do amor. Mas isto é um processo que permanece continuamente a caminho: o amor nunca está "concluído" e completado» (ibid., 17). Daqui deriva, para todos os cristãos e em particular para os «agentes da caridade», a necessidade da fé, daquele «encontro com Deus em Cristo que suscite neles o amor e abra o seu íntimo ao outro, de tal modo que, para eles, o amor do próximo já não seja um mandamento por assim dizer imposto de fora, mas uma consequência resultante da sua fé que se torna operativa pelo amor» (ibid., 31). O cristão é uma pessoa conquistada pelo amor de Cristo e, movido por este amor - «caritas Christi urget nos» (2 Cor 5, 14) - , está aberto de modo profundo e concreto ao amor do próximo (cf. ibid., 33). Esta atitude nasce, antes de tudo, da consciência de ser amados, perdoados e mesmo servidos pelo Senhor, que Se inclina para lavar os pés dos Apóstolos e Se oferece a Si mesmo na cruz para atrair a humanidade ao amor de Deus.

«A fé mostra-nos o Deus que entregou o seu Filho por nós e assim gera em nós a certeza vitoriosa de que isto é mesmo verdade: Deus é amor! (...) A fé, que toma consciência do amor de Deus revelado no coração trespassado de Jesus na cruz, suscita por sua vez o amor. Aquele amor divino é a luz – fundamentalmente, a única - que ilumina incessantemente um mundo às escuras e nos dá a coragem de viver e agir» (ibid., 39). Tudo isto nos faz compreender como o procedimento principal que distingue os cristãos é precisamente «o amor fundado sobre a fé e por ela plasmado» (ibid., 7).

2. A caridade como vida na fé

Toda a vida cristã consiste em responder ao amor de Deus. A primeira resposta é precisamente a fé como acolhimento, cheio de admiração e gratidão, de uma iniciativa divina inaudita que nos precede e solicita; e o «sim» da fé assinala o início de uma luminosa história de amizade com o Senhor, que enche e dá sentido pleno a toda a nossa vida. Mas Deus não se contenta com o nosso acolhimento do seu amor gratuito; não Se limita a amar-nos, mas quer atrair-nos a Si, transformar-nos de modo tão profundo que nos leve a dizer, como São Paulo: Já não sou eu que vivo, é Cristo que vive em mim (cf. Gl 2, 20).

Quando damos espaço ao amor de Deus, tornamo-nos semelhantes a Ele, participantes da sua própria caridade. Abrirmo-nos ao seu amor significa deixar que Ele viva em nós e nos leve a amar com Ele, n'Ele e como Ele; só então a nossa fé se torna verdadeiramente uma «fé que atua pelo amor» (Gl 5, 6) e Ele vem habitar em nós (cf. 1 Jo 4, 12).

A fé é conhecer a verdade e aderir a ela (cf. 1 Tm 2, 4); a caridade é «caminhar» na verdade (cf.Ef 4, 15). Pela fé, entra-se na amizade com o Senhor; pela caridade, vive-se e cultiva-se esta amizade (cf. Jo 15, 14-15). A fé faz-nos acolher o mandamento do nosso Mestre e Senhor; a caridade dá-nos a felicidade de pô-lo em prática (cf. Jo 13, 13-17). Na fé, somos gerados como filhos de Deus (cf. Jo 1, 12-13); a caridade faz-nos perseverar na filiação divina de modo concreto, produzindo o fruto do Espírito Santo (cf. Gl 5, 22). A fé faz-nos reconhecer os dons que o Deus bom e generoso nos confia; a caridade fá-los frutificar (cf. Mt 25, 14-30).

3. O entrelaçamento indissolúvel de fé e caridade

À luz de quanto foi dito, torna-se claro que nunca podemos separar e menos ainda contrapor fé e caridade. Estas duas virtudes teologais estão intimamente unidas, e seria errado ver entre elas um contraste ou uma «dialéctica». Na realidade, se, por um lado, é redutiva a posição de quem acentua de tal maneira o carácter prioritário e decisivo da fé que acaba por subestimar ou quase desprezar as obras concretas da caridade reduzindo-a a um genérico humanitarismo, por outro é igualmente redutivo defender uma exagerada supremacia da caridade e sua operatividade, pensando que as obras substituem a fé. Para uma vida espiritual sã, é necessário evitar tanto o fideísmo como o ativismo moralista.

A existência cristã consiste num contínuo subir ao monte do encontro com Deus e depois voltar a descer, trazendo o amor e a força que daí derivam, para servir os nossos irmãos e irmãs com o próprio amor de Deus. Na Sagrada Escritura, vemos como o zelo dos Apóstolos pelo anúncio do Evangelho, que suscita a fé, está estreitamente ligado com a amorosa solicitude pelo serviço dos pobres (cf. At 6, 1-4). Na Igreja, devem coexistir e integrar-se contemplação e acção, de certa forma simbolizadas nas figuras evangélicas das irmãs Maria e Marta (cf. Lc 10, 38-42). A prioridade cabe sempre à relação com Deus, e a verdadeira partilha evangélica deve radicar-se na fé (cf. Catequese na Audiência geral de 25 de Abril de 2012). De facto, por vezes tende-se a circunscrever a palavra «caridade» à solidariedade ou à mera ajuda humanitária; é importante recordar, ao invés, que a maior obra de caridade é precisamente a evangelização, ou seja, o «serviço da Palavra». Não há acção mais benéfica e, por conseguinte, caritativa com o próximo do que repartir-lhe o pão da Palavra de Deus, fazê-lo participante da Boa Nova do Evangelho, introduzi-lo no relacionamento com Deus: a evangelização é a promoção mais alta e integral da pessoa humana. Como escreveu o Servo de Deus Papa Paulo VI, na Encíclica Populorum progressioo anúncio de Cristo é o primeiro e principal factor de desenvolvimento (cf. n. 16). A verdade primordial do amor de Deus por nós, vivida e anunciada, é que abre a nossa existência ao acolhimento deste amor e torna possível o desenvolvimento integral da humanidade e de cada homem (cf. Enc. Caritas in veritate8).

Essencialmente, tudo parte do Amor e tende para o Amor. O amor gratuito de Deus é-nos dado a conhecer por meio do anúncio do Evangelho. Se o acolhermos com fé, recebemos aquele primeiro e indispensável contacto com o divino que é capaz de nos fazer «enamorar do Amor», para depois habitar e crescer neste Amor e comunicá-lo com alegria aos outros.

A propósito da relação entre fé e obras de caridade, há um texto na Carta de São Paulo aos Efésios que a resume talvez do melhor modo: «É pela graça que estais salvos, por meio da fé. E isto não vem de vós; é dom de Deus; não vem das obras, para que ninguém se glorie. Porque nós fomos feitos por Ele, criados em Cristo Jesus, para vivermos na prática das boas acções que Deus de antemão preparou para nelas caminharmos» (2, 8-10). Daqui se deduz que toda a iniciativa salvífica vem de Deus, da sua graça, do seu perdão acolhido na fé; mas tal iniciativa, longe de limitar a nossa liberdade e responsabilidade, torna-as mais autênticas e orienta-as para as obras da caridade. Estas não são fruto principalmente do esforço humano, de que vangloriar-se, mas nascem da própria fé, brotam da graça que Deus oferece em abundância. Uma fé sem obras é como uma árvore sem frutos: estas duas virtudes implicam-se mutuamente. A Quaresma, com as indicações que dá tradicionalmente para a vida cristã, convida-nos precisamente a alimentar a fé com uma escuta mais atenta e prolongada da Palavra de Deus e a participação nos Sacramentos e, ao mesmo tempo, a crescer na caridade, no amor a Deus e ao próximo, nomeadamente através do jejum, da penitência e da esmola.

4. Prioridade da fé, primazia da caridade

Como todo o dom de Deus, a fé e a caridade remetem para a acção do mesmo e único Espírito Santo (cf. 1 Cor 13), aquele Espírito que em nós clama:«Abbá! – Pai!» (Gl 4, 6), e que nos faz dizer: «Jesus é Senhor!» (1 Cor 12, 3) e «Maranatha! – Vem, Senhor!» (1 Cor 16, 22; Ap 22, 20).

Enquanto dom e resposta, a fé faz-nos conhecer a verdade de Cristo como Amor encarnado e crucificado, adesão plena e perfeita à vontade do Pai e infinita misericórdia divina para com o próximo; a fé radica no coração e na mente a firme convicção de que precisamente este Amor é a única realidade vitoriosa sobre o mal e a morte. A fé convida-nos a olhar o futuro com a virtude da esperança, na expectativa confiante de que a vitória do amor de Cristo chegue à sua plenitude. Por sua vez, a caridade faz-nos entrar no amor de Deus manifestado em Cristo, faz-nos aderir de modo pessoal e existencial à doação total e sem reservas de Jesus ao Pai e aos irmãos. Infundindo em nós a caridade, o Espírito Santo torna-nos participantes da dedicação própria de Jesus: filial em relação a Deus e fraterna em relação a cada ser humano (cf. Rm 5, 5).
A relação entre estas duas virtudes é análoga à que existe entre dois sacramentos fundamentais da Igreja: o Baptismo e a Eucaristia. O Baptismo (sacramentum fidei) precede a Eucaristia (sacramentum caritatis), mas está orientado para ela, que constitui a plenitude do caminho cristão. De maneira análoga, a fé precede a caridade, mas só se revela genuína se for coroada por ela. Tudo inicia do acolhimento humilde da fé («saber-se amado por Deus»), mas deve chegar à verdade da caridade («saber amar a Deus e ao próximo»), que permanece para sempre, como coroamento de todas as virtudes (cf. 1 Cor 13, 13).

Caríssimos irmãos e irmãs, neste tempo de Quaresma, em que nos preparamos para celebrar o evento da Cruz e da Ressurreição, no qual o Amor de Deus redimiu o mundo e iluminou a história, desejo a todos vós que vivais este tempo precioso reavivando a fé em Jesus Cristo, para entrar no seu próprio circuito de amor ao Pai e a cada irmão e irmã que encontramos na nossa vida. Por isto elevo a minha oração a Deus, enquanto invoco sobre cada um e sobre cada comunidade a Bênção do Senhor!

Vaticano, 15 de Outubro de 2012


BENEDICTUS PP. XVI

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Porque nos dois Credos não se professa também “Creio na Eucaristia”?


Responde o padre Edward McNamara, L.C., professor de Teologia e diretor espiritual


ROMA, 25 de Janeiro de 2013 (Zenit.org) - Uma leitora da língua italiana enviou a seguinte pergunta ao padre Edward McNamara:

Porque nos dois Credos não se professa também “Creio na Eucaristia”? -- Sra. A.B., Coréia do Sul
Eis aqui a resposta dada pelo Padre McNamara:

As razões são principalmente de natureza histórica, mas dizem respeito também à própria finalidade da liturgia.

Do ponto de vista histórico, o Credo como o conhecemos, foi desenhado primeiro nos Concílios de Nicéia (325) e de Constantinopla (381), embora em sua forma elaborada aparece pela primeira vez nos atos do Concílio de Calcedônia (451) .

Este Credo estava provavelmente baseado numa profissão de fé batismal e continha todos os elementos essenciais da fé da Igreja.

Ele era principalmente uma resposta a Ário e às outras heresias, e defendia a doutrina da Trindade e da verdadeira e plena divindade e humanidade de Cristo. Nunca foi concebido como uma exposição exaustiva de cada aspecto da fé.

Uma vez que era necessário defender os fundamentos da fé, questões como a natureza da Eucaristia simplesmente não apareceram no horizonte teológico até vários séculos depois.

Além disso, durante este primeiro período, a plenitude da doutrina eucarística era muitas vezes explicada só depois do batismo, ou seja, só depois de que o novo cristão tinha recitado em público o Credo.

A prática de recitar o Credo na Missa é atribuída à Timóteo, Patriarca de Constantinopla (511-517), uma iniciativa que foi copiada por outras Igrejas sob influência bizantina, incluindo a parte da Espanha, que estava então sob o domínio de Bizâncio.

Por volta do ano 568, o imperador bizantino Justiniano ordenou que o Credo fosse recitado em cada Missa celebrada nos seus domínios. Vinte anos depois, em 589, o rei visigodo da Espanha, Recaredo, renunciou à heresia ariana em favor do catolicismo e, por sua vez ordenou que o Credo fosse proclamado em cada Missa.

Cerca de dois séculos mais tarde, reencontramos a prática de recitar o Credo na França e de lá o costume foi se espalhando lentamente em outras partes do Norte da Europa. Por fim, quando no ano de 1114 Henrique II veio à Roma para ser coroado imperador do Sacro Império Romano, ficou surpreso de que lá o Credo não fosse recitado. Responderam-lhe dizendo que Roma nunca tinha cometido um erro em matéria de doutrina, e que por isso não era necessário para os romanos proclamar o Credo durante a Missa. No entanto, foi incluído na liturgia em honra do imperador e, desde então, embora não em todas as missas, mas apenas aos domingos e em algumas festividades.

Os cristãos do Oriente e do Ocidente usam o mesmo Credo, com exceção da expressão Filioque (e o Filho), que a versão latina adiciona como uma referência da procissão do Espírito Santo, uma adição que deu origem a intermináveis e complicadíssimas discussões teológicas.

Apesar desta diferença, há um consenso entre todos os cristãos de que o Credo deveria permanecer assim como está e que nem o Credo, nem muito menos a mesma Missa, seja um lugar apto para dar expressão técnica a cada princípio da fé.

Em outro nível, no entanto, toda a Missa em si é uma profissão de fé. É a fé viva celebrada e anunciada num grande e sublime ato de culto que é transformada numa fé que permeia cada aspecto da atividade diária.

Mesmo se não é explicitamente mencionada a presença real no Credo, os católicos proclamam a sua fé eucarística com quase cada palavra e gesto da Missa e, de modo particular, com o seu Amém no final da oração eucarística e quando recebem a Comunhão.

De forma semelhante expressam liturgicamente a sua fé em outros dogmas não contemplados no Credo. Ir à missa na Festa da Imaculada Conceição e da Assunção, proclama também a nossa fé nestas doutrinas.

Confessar ou receber o sacramento da unção dos enfermos confirmam a nossa confiança no próprio sistema sacramental e a nossa fé de que Cristo concedeu à Igreja o poder de perdoar os pecados.

Em suma, todo ato de culto litúrgico é, pela sua mesma natureza, também uma proclamação de fé.


* Os leitores podem enviar perguntas para liturgia.zenit@zenit.org. Pede-se que, por gentileza, se mencione a palavra “Liturgia” no campo do objeto. O texto deveria incluir as iniciais, o nome da cidade e estado, província ou nação. Padre McNamara poderá responder somente a uma pequena seleção das muitas perguntas que chegam na redação.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Catequeses do Ano da Fé. Virgem Maria. Ícone da fé obediente


PAPA BENTO XVIAUDIÊNCIA GERAL
Sala Paulo VI
Quarta-feira, 19 de Dezembro de 2012


Virgem Maria. Ícone da fé obediente

Queridos irmãos e irmãs!

No caminho do Advento, a Virgem Maria ocupa um lugar especial, como Aquela que de maneira singular esperou a realização das promessas de Deus, acolhendo na fé e na carne Jesus, o Filho de Deus, em plena obediência à vontade divina. Hoje, gostaria de meditar brevemente convosco a propósito da fé de Maria, a partir do grande mistério da Anunciação.

«Chaîre kecharitomene, ho Kyrios meta sou», «Ave, cheia de graça, o Senhor está contigo!» (Lc 1, 28). São estas as palavras — citadas pelo evangelista Lucas — com as quais o arcanjo Gabriel se dirige a Maria. À primeira vista, o termo chaîre, “ave”, parece uma saudação normal, usual no âmbito grego, mas estas palavras, se forem lidas no contexto da tradição bíblica, adquirem um significado muito mais profundo. Este mesmo termo aparece quatro vezes na versão grega do Antigo Testamento e sempre como anúncio de alegria pela vinda do Messias (cf. Sf 3, 14; Gl 2, 21; Zc 9, 9; Lm 4, 21). Portanto, a saudação do anjo a Maria constitui um convite à alegria, a um júbilo profundo, anuncia o fim da tristeza que existe no mundo, diante do limite da vida, do sofrimento, da morte, da maldade e da obscuridade do mal que parece ofuscar a luz da bondade divina. Trata-se de uma saudação que marca o início do Evangelho, da Boa Nova.

Mas por que Maria é convidada a alegrar-se deste modo? A resposta encontra-se na segunda parte da saudação: “o Senhor está contigo”. Também aqui, para compreender bem o sentido desta expressão, devemos consultar o Antigo Testamento. No Livro de Sofonias encontramos esta expressão: «Alegra-te, filha de Sião... O rei de Israel, que é o Senhor, está no meio de ti... O Senhor teu Deus está no meio de ti como Salvador poderoso» (3, 14-17). Nestas palavras existe uma promessa dupla feita a Israel, à filha de Sião: Deus virá como Salvador e fará a sua morada precisamente no meio do seu povo, no ventre da filha de Sião. No diálogo entre o anjo e Maria realiza-se exactamente esta promessa: Maria é identificada com o povo desposado por Deus, é verdadeiramente a Filha de Sião em pessoa; é nela que se cumpre a expectativa da vinda definitiva de Deus, é nela que o Deus vivo faz a sua morada.

Na saudação do anjo, Maria é chamada «cheia de graça»; em grego o termo «graça», charis, tem a mesma raiz linguística da palavra «alegria». Também nesta expressão é ulteriormente esclarecida a nascente do alegrar-se de Maria: o júbilo provém da graça, ou seja, deriva da comunhão com Deus, do facto de manter um vínculo tão vital com Ele, a ponto de ser morada do Espírito Santo, totalmente plasmada pela obra de Deus. Maria é a criatura que de modo singular abriu totalmente a porta ao seu Criador, colocando-se nas suas mãos sem quaisquer limites. Ela vive inteiramente dana relação com o Senhor; põe-se em atitude de escuta, atenta a captar os sinais de Deus no caminho do seu povo; está inserida numa história de fé e de esperança nas promessas de Deus, que constitui o tecido da sua existência. E submete-se de maneira livre à palavra recebida, à vontade divina na obediência da fé.

O evangelista Lucas narra a vicissitude de Maria através de um paralelismo requintado com a vicissitude de Abraão. Do mesmo modo como o grande Patriarca é o pai dos crentes, que respondeu à chamada de Deus para sair da terra em que vivia, das suas seguranças, para começar a percorrer o caminho rumo a uma terra desconhecida e possuída só na promessa divina, assim Maria entrega-se com plena confiança à palavra que lhe anuncia o mensageiro de Deus, tornando-se modelo e mãe de todos os crentes.

Gostaria de sublinhar mais um aspecto importante: a abertura da alma a Deus e à sua obra na fé inclui também o elemento da obscuridade. A relação do ser humano com Deus não cancela a distância entre Criador e criatura, não elimina aquilo que o apóstolo Paulo afirma perante as profundezas da sabedoria de Deus: «Quão impenetráveis são os seus juízos e inexploráveis os seus caminhos!» (Rm 11, 33). Mas precisamente aquele que — como Maria — está aberto de modo total a Deus, consegue aceitar a vontade divina, ainda que seja misteriosa, embora muitas vezes não corresponda à propria vontade e seja uma espada que trespassa a alma, como profeticamente o velho Simeão dirá a Maria no momento em que Jesus é apresentado no Templo (cf. Lc 2, 35). O caminho de fé de Abraão abrange o momento de alegria pelo dom do filho Isaac, mas inclusive o momento da obscuridade, quando deve subir ao monte Moriá para cumprir um gesto paradoxal: Deus pede-lhe que sacrifique o filho que lhe tinha acabado de doar. No monte, o anjo ordena-lhe: «Não estendas a tua mão sobre o menino, e não lhe faças nada; agora sei que temes a Deus, e não me negaste o teu filho, o teu único filho» (Gn 22, 12); a confiança plena de Abraão no Deus fiel às promessas não esmorece nem sequer quando a sua palavra é misteriosa e difícil, quase impossível, de aceitar. É assim que acontece para Maria, pois a sua fé vive a alegria da Anunciação, mas passa inclusive através da obscuridade da crucifixão do seu Filho, para poder chegar até à luz da Ressurreição.

Não é diferente inclusive para o caminho de fé de cada um de nós: encontramos momentos de luz, mas vivemos também outros nos quais Deus parece ausente; o seu silêncio pesa no nosso coração e a sua vontade não corresponde à nossa, àquilo que nós gostaríamos. Mas quanto mais nos abrirmos a Deus, acolhermos o dom da fé, depositarmos totalmente nele a nossa confiança — como Abraão e como Maria — tanto mais Ele nos torna capazes, mediante a sua presença de viver cada situação da vida na paz e na certeza da sua fidelidade e do seu amor. No entanto, isto significa sair de nós mesmos e dos nossos projectos, a fim de que a Palavra de Deus seja a lâmpada orientadora dos nossos pensamentos e das nossas acções.

Gostaria de reflectir ainda sobre um aspecto que sobressai das narrações sobre a Infância de Jesus, escritas por são Lucas. Maria e José levam o Filho a Jerusalém, ao Templo, para o apresentar e consagrar ao Senhor, como prescreve a lei de Moisés: «Todo o primogénito varão será consagrado ao Senhor» (cf. Lc 2, 22-24). Este gesto da Sagrada Família adquire um sentido ainda mais profundo, se o interpretarmos à luz da ciência evangélica de Jesus com doze anos que, depois de três dias de procura, é encontrado no Templo a dialogar com os doutores. Às palavras cheias de preocupação de Maria e José: «Filho, porque nos fizeste isto? Olha que teu pai e eu andávamos aflitos à tua procura», corresponde a resposta misteriosa de Jesus: «Por que me procuráveis? Não sabíeis que devia estar em casa de meu Pai?» (Lc 2, 48-49). Ou seja, na propriedade do Pai, na casa do Pai, como o é um filho. Maria deve renovar a fé profunda com que disse «sim» na Anunciação; deve aceitar que a precedência seja do verdadeiro Pai de Jesus; deve saber deixar livre aquele Filho que gerou, a fim de que siga a sua missão. E o «sim» de Maria à vontade de Deus, na obediência da fé, repete-se ao longo de toda a sua vida, até ao momento mais difícil da Cruz.

Diante de tudo isto, podemos interrogar-nos: como foi que Maria conseguiu viver este caminho ao lado do Filho, com uma fé tão sólida, também nas obscuridades, sem perder a confiança completa na obra de Deus? Existe uma atitude de fundo que Maria assume perante aquilo que se verifica na sua vida. Na Anunciação, Ela sente-se perturbada ao ouvir as palavras do anjo — trata-se do temor que o homem sente quando é tocado pela proximidade de Deus — mas não é a atitude de quantos têm medo diante daquilo que Deus pode pedir. Maria medita, interroga-se a respeito do significado de tal saudação (cf. Lc 1, 29). O termo grego utilizado no Evangelho para definir este «meditar», «dielogizeto», evoca a raiz da palavra «diálogo». Isto significa que Maria entra em diálogo íntimo com a Palavra de Deus que lhe foi anunciada, não a considera superficialmente, mas detém-se, deixa-a penetrar na sua mente e no seu coração para compreender aquilo que o Senhor deseja dela, o sentido do anúncio. Outra referência à atitude interior de Maria diante da obra de Deus encontramo-la, ainda no Evangelho de são Lucas, no momento da Natividade de Jesus, depois da adoração dos pastores. Afirma-se que Maria «conservava todas estas coisas, ponderando-as no seu coração» (Lc 2, 19); em grego, o termo é symballon; poderíamos dizer que Ela «mantinha unidos», «reunia» no seu coração todos os eventos que lhe estavam a acontecer; colocava cada um dos elementos, cada palavra, cada acontecimento no interior do tudo confrontando-o, conservando-o e reconhecendo que tudo deriva da vontade de Deus. Maria não se limita a uma primeira compreensão superficial daquilo que acontece na sua vida, mas sabe olhar em profundidade, deixa-se interpelar pelos eventos, elabora-os, discerne-os e alcança aquele entendimento que só a fé pode garantir. É a humildade profunda da fé obediente de Maria, que acolhe em si mesma também aquilo que não compreende no agir de Deus, deixando que seja Deus quem abre a sua mente e o seu coração. «Feliz daquela que acreditou que teria cumprimento as coisas que lhe foram ditas da parte do Senhor» (Lc 1, 45), exclama a sua prima Isabel. É precisamente pela sua fé, que todas as gerações lhe chamarão ditosa.

Caros amigos, a solenidade do Natal do Senhor, que daqui a pouco celebraremos, convida-nos a viver esta mesma humildade e obediência de fé. A glória de Deus não se manifesta no triunfo e no poder de um rei, não resplandece numa cidade famosa, num palácio luxuoso, mas faz a sua morada no ventre de uma virgem, revela-se na pobreza de um menino. A omnipotência de Deus, também na nossa vida, age com a força, muitas vezes silenciosa, da verdade e do amor. Então, a fé diz-nos que no final o poder indefeso daquele Menino vence o ruído das potências do mundo.


Saudações

Amados peregrinos de língua portuguesa, a minha saudação amiga para todos, com votos de um santo Natal de Jesus no coração e na família de cada um, pedindo a mesma humildade e obediência da fé de Maria e José, que vos faça ver, na força indefesa daquele Menino, a vitória final sobre todos os arrogantes e rumorosos poderes do mundo. Bom Natal!