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Dizem por ai que a melhor forma de iniciar qualquer
coisa é pelo começo. Não discordo. Sendo assim vamos começar a analisar o
documento do Concílio Vaticano II, intitulado Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium que legislou
sobre a sagrada liturgia.
Pois bem, como tinha dito, o início é sempre o
melhor lugar para se começar, então vamos iniciar com um excerto do primeiro
número do documento:
1. O sagrado Concílio propõe-se fomentar a
vida cristã entre os fiéis, adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as
instituições susceptíveis de mudança, promover tudo o que pode ajudar à união
de todos os crentes em Cristo, e fortalecer o que pode contribuir para chamar a
todos ao seio da Igreja. Julga, por isso, dever também interessar-se de modo
particular pela reforma e incremento da Liturgia.
Como é bom lermos a introdução de todas as coisas,
não é mesmo? Hoje já se perdeu esse costume já que a moda é o rápido. 140
caracteres e abreviações das mais esdrúxulas é que passou a ser a melhor forma
de se escrever. Ler prefácio de livros? Nem pensar. Quem faz isso hoje em dia?
Pois perdem uma enorme riqueza ao não lerem os prefácios e as introduções dos
livros. Aliás, perdem muito em não ler livros.
Mas o que isso tudo tem a ver com a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium? A princípio tudo.
O número 1 do texto coloca as propostas para o
Concílio. Essas propostas são lidas por muitos sem se ler o final do parágrafo.
Inicialmente diz: “O sagrado Concílio propõe-se (...)”
a) (...) fomentar a vida cristã entre os fiéis
(...). Fomentar a vida cristã é o que a Igreja sempre fez e sempre fará,
afinal é a forma de se chegar à salvação. O grande problema está em entender
como se fomenta a vida cristã. Infelizmente para muitos que deturpam o
verdadeiro ensinamento e espírito do Concílio, a vida cristã se fomenta através
de oração e obediência à Igreja e todos os seus preceitos, eu disse todos e não
aos que você escolher.
Obviamente que obedecer e crer na Igreja importa em
ter uma vida de oração, mas é bom que se destaque isso, afinal não é apenas mais
uma regra. Dificilmente encontramos um que se diz católico que se predisponha a
rezar três ave-marias durante o dia, aliás, será difícil encontrar um que
rigidamente encontre disposição inflexível de ir à missa todos os domingos. Até
para essa presença na santa missa as dificuldades se avolumam.
Então, a Igreja sempre buscou fomentar a vida
cristã, o grande problema são os meios para esse fomento. Alguns consideram que
a política é um grande meio para esse fomento, do que não discordo em momento
algum, contudo não posso concordar que seja o único nem que seja o mais
importante.
Da mesma forma, realizar celebrações litúrgicas da
santa missa em que as pessoas que ali estão presentes necessariamente sejam o
alvo, ou seja, faz-se a missa não para Deus, mas para a torcida, também não é o
meio de fomentar a vida cristã. Vida cristã não é estar dentro da Igreja para
fazer o que bem entender. É estar dentro da Igreja e fazer parte dela. Quando
se faz parte de um corpo não se pode ir contra o comando desse corpo. Ao acaso
a mão não obedece a cabeça? Ou se rebela contra ela e age como bem entender? É
simplesmente absurdo pensar assim.
A Igreja fomenta a vida cristã quando age de forma
cristã, ensina de forma cristã e exige de seus fiéis atitude e ensinamento
cristãos. A Igreja age de forma cristã a medida que é esposa de Cristo e Dele
não pode se separar. Age de forma cristã a medida que Cristo a quis e a fundou.
Age de forma cristã a medida que é guiada pelo Espírito Santo.
Fomentar a vida cristã entre os fiéis não pode ser
interpretado como sendo um motivo para o fim das hierarquias uma vez que a vida
cristã entre os fiéis é incompleta já que não podem fazer parte da hierarquia
da Igreja. Não se assustem, é isso que muitos, inúmeros pensam por ai.
Quando o Concílio, através da Sacrosanctum Concilium afirma que é preciso fomentar a vida cristã
entre os fiéis, não afirma que os fiéis precisam tomar as decisões que sempre
couberam a diáconos, sacerdotes, bispos, cardeais... não significa também que o
fiéis precisam passar a cumprir funções que esses mesmos diáconos, sacerdotes,
bispos... sempre cumpriram. É por causa de pensamentos (maus pensamentos) como
esses que se disseminou uma figura nos altares que nunca deveria ter as funções
que culturalmente passou a ter: o Ministro Extraordinário da Sagrada Comunhão.
O mesmo poderíamos dizer para os excessos que as equipes de liturgia cometem
com a conivência dos sacerdotes e o caos que passou a ser os grupos de
catequistas.
Tudo tem um pouco a ver com essa intenção mal
interpretada de fomentar a vida cristã
entre os fiéis. Toda a questão está envolvida no ponto em que a maioria dos
que se dizem católicos não são nem nunca serão católicos. Isso não é de hoje e
hoje não terminará. Os católicos de verdade sempre foram poucos, muito poucos,
mesmo na Idade Média. Apenas era moda e conveniente ser católico. Os católicos
verdadeiros sempre foram um punhadinho.
Isso a Igreja sempre soube e sempre se colocou na
posição de mudar essa situação, contudo nesse documento a Igreja deixa bem
claro que o meio que ela encontrou para que os católicos verdadeiros aumentem
em qualidade e quantidade é pelo testemunho, pelo exemplo. Fomentando a vida
cristã entre os fiéis, outros que se dizem fiéis entendem o que é o verdadeiro
cristianismo católico.
b) (...) adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as instituições
susceptíveis de mudança (...). Adaptar sim, claro, porque não? Cada tempo
tem suas necessidades, cada tempo tem seu pensamento humano, cada tempo tem
suas tecnologias. A Igreja militante está inserida nesse mundo e nesse tempo.
Deve usar esse tempo a seu favor, mas não ser escrava dele.
Adaptar as instituições significa caminhar conforme
o ritmo da dança, contudo a ressalva é interessante e as vezes acho que é
invisível. A frase diz que é preciso adaptar melhor ao tempo as instituições e
continua: suscetíveis de mudança, ou seja, é requisito. A frase não termina em
instituições. A parte que menciona o “susceptíveis
de mudança” é essencial para o entendimento de que certas coisas não são
susceptíveis de mudanças: o sacrifício da missa é uma dessas coisas, o respeito
à eucaristia é outra e a valorização do sagrado outra. Não vamos nem comentar
sobre a doutrina revelada, os dogmas e tantos outros pontos. Fiquemos só
nesses, afinal estamos em um documento que fala sobre liturgia.
Quando afirmo que o sacrifício da missa não é
susceptível de mudança, não falo de rito. Não me interpretem conforme sua
vontade. Falo do sacrifício mesmo. Quantos dos que agora estão lendo esse texto
tem a perfeita consciência de que a missa é sacrifício? E quanto estão ouvindo
(lendo) isso pela primeira vez? A missa se tornou de tal forma culto agradável
aos homens que deixou de ser sacrifício. Ninguém quer sacrifício. Ninguém quer
dor, muito menos morte. Quem quer isso? Façamos da missa um culto agradável a
quem assiste. Porque não celebramos a vida? Afinal Cristo ressuscitou pra nos
salvar, não foi isso? Não, não foi! Cristo morreu pra nos salvar e foi Ele quem
quis assim. Não precisava ter sido assim, mas Ele assim o quis. Eu ou você
temos autoridade pra questionar ou mudar isso?
A questão passa a ser outra: quais instituições são
susceptíveis de mudança? Como essa mudança irá ocorrer e com qual velocidade
isso irá acontecer? Isso tudo depende da Igreja, não de nós e a Igreja tem seu
tempo. Não queira que tudo aconteça durante o seu ínfimo tempo de vida por
aqui. A Igreja não será destruída até que chegue o dia do juízo final. Essa é a
promessa em Mateus 28,20.
c) (...) promover tudo o que pode ajudar à
união de todos os crentes em Cristo (...). Essa frase pode ser interpretada
das piores formas possíveis em prol de um ecumenismo falso e hipócrita.
Promover todo o possível para ajudar todos os
crentes em Cristo, não significa de forma alguma em concordar com os erros, as
vezes crassos de nossos irmão separados, vulgo protestantes.
Essa promoção também não significa confraternização
litúrgica com eles.
O ecumenismo sempre foi a aproximação com os
cristãos, eu disse cristãos, para que possamos iniciar uma conversação digna,
legítima, leal e saudável sobre nossas diferenças para que eles entendam que o
seu retorno à Igreja de Cristo é o melhor caminho. Da mesma forma, passado esse
período de conversação, estabelecer normas para receber esses irmãos que
estavam separados dentro da Igreja de Cristo. É o que vem acontecendo com
muitos leigos e clérigos anglicanos e às vezes com denominações inteiras de
igrejas protestantes, especialmente nos Estados Unidos.
E tem outro detalhe; ecumenismo é entre cristãos.
Não existe ecumenismo com não cristãos. Com esses é muito complicado iniciar
uma conversa, já que ou não creem em Deus uno e verdadeiro, ou deturparam-no de
tal forma que fica impossível estabelecer um início para a conversa. Nesse
ponto a conversa se dá em outro nível, não em ecumenismo. Lembre-se que os
espíritas se colocam nesse grupo de não cristãos.
Pois bem, a frase é simples e pode ser interpretada
erroneamente, contudo não seria assim se quem lesse se interessassem em ler a
frase como um todo que diz:
(...) promover tudo o que pode ajudar à
união de todos os crentes em Cristo, e fortalecer o que pode contribuir para
chamar a todos ao seio da Igreja (...)
Chamar a todos ao seio da Igreja é o motivo
principal do ecumenismo. Por esse único motivo é que se deve promover tudo o que pode ajudar à união de
todos os crentes em Cristo.
Concluindo sobre esses três pontos, temos que tudo
desemboca em fortalecer o que pode
contribuir para chamar a todos ao seio da Igreja, independentemente se
acontecer por meio do ecumenismo, através de adaptar instituições que são
susceptíveis a adaptação ou fomentando a vida cristã entre os fiéis.
Finalmente, o parágrafo se auto conclui julgando a
si próprio e aos anseios do Concílio dizendo que:
Julga, por isso, dever também interessar-se
de modo particular pela reforma e incremento da Liturgia.
Mais uma vez pode ser levado um erro crasso de
interpretação: reformar e incrementar a liturgia nunca significou mudar seu
motivo de existir, sua função e sua sacralidade.
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