quarta-feira, 21 de setembro de 2016

As novidades do artigo 942 do CPC quanto ao julgamento nos Tribunais e o fim dos embargos infringentes.

1) Introdução e histórico. O fim dos embargos infringentes.

Não se trata de novidade no estudo processual civil, seja deste novo código, seja do antigo, seja da doutrina processual como um todo, que o finado recurso dos embargos infringentes eram dos mais mal vistos dentro do ordenamento. Por isso mesmo não é novidade que a grande maioria da doutrina, pelo menos aquela que interessa, pois mais bem fundamentada, sempre advogou a eliminação desse recurso.

Um dos grandes argumentos dos que pretendiam sepultar os embargos infringentes era o de que o recurso emperrava o processo justamente no momento mais crucial e era absolutamente desnecessário já que já existia uma vitória, mesmo que não unânime.

Nos estudos para desenvolver esse novo Código um novo formato para os julgamentos não unânimes foi desenvolvido. A ideia foi extinguir os embargos infringentes como recurso e ampliar a quantidade de votos, mesmo que isso não garantisse a melhoria da decisão, mas pelo menos garantia uma maior visibilidade por mais julgadores e, teoricamente uma decisão mais bem fundamentada e discutida já que quanto mais cabeças, melhor a sentença. Como dissemos, estamos no campo da teoria e o intuito maior que era de eliminar com os embargos infringentes suprimindo o antigo artigo 530 foi satisfeito.

Pois bem, agora o CPC determina que se suspenda o julgamento quando for não unânime, ou seja, quando o placar ficar em 2x1 para que sejam convocados novos julgadores em número capaz de viabilizar a inversão do resultado inicial. Ficou assim redigido o artigo 942, caput:

Art. 942.  Quando o resultado da apelação for não unânime, o julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores.

Assim, a ideia é que o resultado de 2x1, com três julgadores que é o normal, teria que ter a convocação de mais dois julgadores para que possibilite uma “virada” no placar para 3x2. Melhor ainda explicando, o prosseguimento do julgamento deve garantir que o voto minoritário possa passar a preponderante.

Alguns doutrinadores, entre eles os da mais alta estirpe, já vem criticando o artigo 942 devido o fato de considerarem desnecessário, uma vez que o melhor seria a exclusão do antigo artigo 530 (embargos infringentes) e simplesmente não fizesse mais nada deixando as decisões não unânimes com o mesmo peso das unânimes.

2) Da obrigatoriedade da convocação de novos julgadores.

Lembre-se que suspensão do julgamento com convocação imediata ou não de novos julgadores para que esses possam votar, não envolve a concordância das partes, muito menos qualquer tipo de acordo ou reinterpretação da turma julgadora. Trata-se de situação claramente descrita que deve ser resolvida com a mesma clareza que o artigo impõe.

Essa é uma nova mudança, uma vez que os embargos infringentes eram facultativos e essa modalidade de suspensão do julgamento e convocação de novos julgadores é obrigatória sob pena de nulidade.

3) Do número de julgadores.

Lembre-se, ainda, que a lei não determina número exato de julgadores a serem convocados, contudo diz que precisam ser convocados ao menos em número suficiente para que sobreponha o número de votos vencidos, ou seja, sendo o resultado de 2x1, pelo menos mais dois julgadores devem ser convocados para possibilitar um resultado “de virada” para 3x2. Entretanto, não menciona esse número de dois julgadores. Podem ser mais, desde que não possibilite um empate, isto é, não é possível número par de julgadores.

Por outro lado, dificilmente veremos uma turma julgadora convocando mais do que número mínimo de julgadores uma vez que, na prática, a quantidade de trabalho é grande e fazer o mínimo já será um esforço extra, fazer mais do que pede o código será uma situação certamente inusitada.

4) Dos critérios processuais para convocação dos novos julgadores.

Relativamente aos critérios processuais para a convocação dos novos julgadores, existem 3 possibilidades:

A primeira diz que o julgamento será em sessão futura a ser designada. Tal sessão futura normalmente já está muito bem delineada nos regimentos internos nos Tribunais e não precisa fugir muito daquilo.

A segunda, é de acontecer na mesma sessão se estiverem presentes outros julgadores. Essa situação poderá ser muito comum uma vez que uma Câmara ou Seção Cível no dia dos julgamentos reúnem várias turmas. A composição costuma ser de pelo menos cinco membros que se reúnem ao mesmo tempo e fazem as diversas combinações para formar as turmas. Isso significa que, a não ser que alguém falte à sessão, sempre haverá possibilidade de convocar os dois que estarão de fora da turma de julgamento naquele processo em específico.

A terceira é que, se for ação rescisória, haverá um redirecionamento para o órgão de maior composição.

5) Da ampla defesa e contraditório com nova sustentação oral.

Com o chamamento de novos julgadores, renovada estará toda a garantia de contraditório e ampla defesa, ou seja, nova sustentação oral deverá acontecer, afinal os novos julgadores convocados não tiveram a oportunidade de ouvir as razões dos defensores.

Tal situação é, sem dúvida nenhuma, um ganho por vários motivos. Um dos principais pontos de ganho é que já serão conhecidas as razões de mérito para deferimento ou indeferimento de cada ponto de cada um dos três julgadores e a nova sustentação oral poderá fixar base nesses pontos para falar o que realmente é necessário, inclusive para mudar o entendimento dos que já votaram. Pensando assim fica fácil de entender que menores serão as surpresas na decisão se o advogado puder atacar nessa segunda sustentação razões que serviram de mérito para o julgador.

6) Da nova sustentação no caso de julgadores convocados já presentes.

Saliente-se apenas uma questão que será problema em algumas interpretações e que, igualmente, será alvo de discussão e possível pacificação futura pelo STJ: se e quando acontecer de a ser necessário convocar mais três julgadores e esses julgadores já estarem presentes, ou seja, no caso de câmaras e seções cíveis que possuem cinco membros em sua formação, embora apenas três julguem, basta convocar os três que estão presentes ali na mesma sessão. O problema está justamente na sustentação oral. Ela será renovada ou será considerado que aqueles julgadores já ouviram a sustentação e são capazes de julgar? O problema está colocado. A solução não. Afinal teremos uma série de dificuldades nesse ponto.

Imaginar que o julgador que não faz parte da turma de julgamento original está apto para julgar porque estava presente na sustentação oral é entender que, mesmo que o julgador não tenha nada a ver com o processo e teoricamente nem precise estar presente, ouviu, prestou atenção e formou opinião por simples curiosidade profissional jurídica e zelo. Ora, não estamos dizendo que nossos julgadores não são zelosos nem que não gostam do meio jurídico a ponto de não se interessarem por pura curiosidade de um tema, mas é simplesmente absurdo imaginar que todos os julgadores estarão totalmente imersos nas discussões de todos os processos, mesmo que seu julgamento não seja solicitado. Seria desumano exigir tal atenção dos julgadores.

Assim sendo, é necessário que a sustentação oral seja refeita, mesmo que os julgadores convocados estivessem presentes na primeira sustentação, embora sem compromisso de atenção ou formação de opinião.

7) Conclusão.

Ao que se pode perceber, é como se os embargos infringentes continuassem a existir, embora com uma aceleração muito maior em seus procedimentos e não como um recurso facultativo, mas um procedimento obrigatório. Por isso a crítica de alguns doutrinadores.

As três possibilidades para esse procedimento ser feito se limitam a: recurso de apelação; ação rescisória com resultado favorável, ou seja, procedente e; agravo de instrumento que reforme decisão que julga parcialmente o mérito. Por outro lado, não será possível o uso dessa nova técnica quando: for julgamento de incidente de competência e resolução de demandas repetitivas; julgamento de remessa necessária e; decisões proferidas pelos plenários ou Cortes especiais.

Lembre-se que o julgamento não unânime e suspenso para a convocação de novos julgadores, está em aberto, ou seja, não há julgamento de fato e ainda haverá prosseguimento o que, por sua vez garanta aos julgadores que já; tenha proferido o que voto, que o revisem para mudarem-no em direção oposta, caso queiram.


O que existe com toda essa nova sistemática é um temor de que aconteça uma busca por decisões unânimes para que se agilize o trabalho dos Tribunais. Entretanto, antes do novo código e dessa nova sistemática de julgamentos não unânimes essa busca por decisões unânimes poderia ser evitada de algum modo? Os embargos infringentes causavam um atraso muito maior e mesmo assim isso não necessariamente acontecia. A verdade é que não se pode pretender evitar mudanças com o simples receio de tentar adivinhar as exceções que podem vir a acontecer.

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Da idade mínima para contrair matrimônio na Igreja Católica.


No Código de Direito Canônico existem 12 impedimentos que dirimem o casamento, ou seja, que impedem de forma absoluta e, se contraído o torna inválido, isto é, nulo. Alguns desses impedimentos são de origem divina, outros, de direito eclesiástico. Os de direito eclesiástico são os que obrigam apenas os que são batizados na Igreja Católica ou que nela são acolhidos. Os de origem divina obrigam todos os homens, mesmo os não batizados. Não entraremos nesse mérito nesse texto, uma vez que é extremamente subjetivo e demandaria um texto exclusivo para isso.

Um desses impedimentos, que é o que mencionaremos nesse aqui, é o impedimento por defeito de idade que está incluso no Código no cânone 1083 e parágrafos. Vejamos:

Cân 1083
§1 O homem antes do dezesseis (16) anos completos e a mulher antes dos quatorze (14) também completos não podem contrair matrimônio válido.
§2 Compete à conferência dos Bispos estabelecer uma idade superior para a celebração do matrimônio.

O cânone é claro no que diz, porém coloca, no parágrafo 2 que “à conferência dos Bispos”, no nosso caso a CNBB, “compete estabelecer uma idade superior”. Que fique bem claro que a regra básica e universal é essa de 16 anos para homens e 14 anos para a mulher. Entretanto, pode, caso queira e ache conveniente, com autorização expressa da Santa Sé nesse cânone, que a conferência aumente a idade de um, de ambos ou simplesmente deixe como está. Nunca poderá a conferência diminuir essa idade.


A ideia da Igreja Universal é que os nubentes precisam ter um mínimo de maturidade biológica e psíquica para contrair matrimônio válido. Alguns podem se perguntar se uma menina de 14 anos tem essa maturidade. Pois bem, vivemos em um mundo onde se fica adulto cada vez mais tarde. Por outro lado, não se cobra idade adulta para um matrimônio válido, se cobra maturidade biológica, e isso uma mulher de 14 anos tem assim como um homem de 16, bem como maturidade psíquica. Aqui é que o problema pode aparecer, isso na opinião desse articulista.


Os legisladores que fizeram o Código de Direito Canônico, na época, tinham em mente aumentar essa idade, porém foi muito difícil encontrar uma idade mais alta que atingisse de forma mais ou menos isonômica toda a Igreja Universal e todas as culturas. Foi, portanto, mantida a idade que o Código de 1917 considerava a ideal tanto para homens quanto para mulheres baseando-se no direito fundamental de casamento, porém levando-se em conta que é preciso mais um pouco do que aquela maturidade que se presume com a puberdade. É por esse motivo que temos o cânone 1072, que diz que os jovens são desencorajados a se casar enquanto não se sentirem amadurecidos para a vida.

Cân 1072. Os pastores de almas procurem afastar do matrimônio os jovens antes da idade em que se usa contrair o matrimônio, conforme o costume de cada região.

A ideia é justamente que não se contraia o matrimônio sem uma maturidade psíquica, uma vez que a maturidade biológica já existe com a puberdade. Há regiões, dentro do próprio Brasil, em que será possível jovens se casarem antes dos 18 anos, já em outras regiões, notadamente as regiões metropolitanas, isso é bem mais incomum. Os motivos para que esses matrimônios não ocorram são os mais variados e, obviamente, nem sempre estão inseridos no critério de maturidade psíquica para o casamento, mas muitas vezes de maturidade financeira, o que não é um requisito imposto pela Igreja. Outra vez a discussão desse ponto é extremamente válida e polêmica, contudo nos ateremos aos fatos: a Igreja não impõe nenhuma condição mínima financeira para que o matrimônio seja ou não válido.

Outra coisa que é preciso que fique clara é que esse é um impedimento de direito eclesiástico que não obriga os não batizados, consequentemente. Nesse caso os nubentes estão vinculados apenas pela lei civil, que também impõe idade mínima.

Entretanto, há uma forma de conseguir a dispensa desse impedimento. Esse pode ser o grande motivo para a leitura desse texto por muitos aqui. O Ordinário Local, ou seja, o Bispo governante, pode dispensar do impedimento de idade. Para isso é preciso que se apresente um motivo grave, uma razão forte, principalmente nesse nosso tempo em que a taxa de separações é grande, prematura e tende a piorar.

A CNBB, particularmente, baixou uma norma para esse tipo de ato, afim de dar a liceidade para matrimônio com idade abaixo da mínima para o casamento.

“Sem licença do Bispo Diocesano, fora do caso de urgente e estrita necessidade, os párocos ou seus delegados não assistam aos matrimônios de homens menores de dezoito anos ou de mulheres menores de dezesseis”

Pois bem, a CNBB fez uso do §2 do cânone 1083 e aumentou a idade, entretanto, claramente que a CNBB seguiu o Código Civil da época que assim também mencionava. Com o Novo Código Civil de 2002, que baixou ambas as idades para 16 anos, tende a CNBB a fazer o mesmo, contudo ainda não o fez e está demorando muito para fazer.

Outro ponto a ser observado é que para o Direito Canônico, atinge-se a maioridade aos dezoito anos (cânon 97, §1), portanto, ao menor que deseja contrair matrimônio é indispensável o consentimento paterno (cf. cânon 1.071, §1). Se os pais se opõem razoavelmente à realização do matrimônio, ou ignoram essa circunstância, caberá ao Ordinário local conceder a autorização.


Concluindo, no Brasil, hoje, apenas homens com 18 anos completos e mulheres com 16 anos completos podem contrair matrimônio na Igreja Católica sem precisarem de autorização expressa do Bispo e/ou dos pais. Essas idades tendem a mudar com novo decreto da CNBB para baixar ambas para 16 anos ou seguir a regra universal de homens com 16 e mulheres com 14, o que nos parece difícil sendo mais fácil baixar ambos para 16 anos. Fora dessas idades de 18 para homens e 16 para mulheres, é preciso autorização expressa do Bispo Diocesano e/ou dos pais sob pena de ser inválido o matrimônio contraído.