segunda-feira, 19 de maio de 2025

Tema 881 do STF. Relativização da coisa julgada.

No julgamento do Recurso Extraordinário n.º 949.297/CE, o Supremo Tribunal Federal firmou a seguinte tese de repercussão geral no Tema 881:

"As decisões do STF em controle concentrado ou em repercussão geral devem ser observadas pelos juízes e tribunais, ainda que em detrimento da coisa julgada."

Essa formulação representa, na prática, a autorização para que decisões judiciais transitadas em julgado — que já produziram todos os seus efeitos e se tornaram definitivas — possam ser desconstituídas em razão de posterior entendimento firmado pelo STF, seja no controle concentrado de constitucionalidade, seja em sede de repercussão geral.

A consequência direta da tese é a relativização da coisa julgada, não por força de alteração normativa constitucional, mas por decisão jurisprudencial superveniente. Isso implica dizer que o STF criou, por via interpretativa, uma hipótese nova de rescindibilidade da coisa julgada, fora das hipóteses taxativamente previstas no art. 966 do CPC/2015 e, pior, em violação direta ao art. 5º, XXXVI da Constituição Federal, que garante a coisa julgada como cláusula pétrea.

O problema central é que essa decisão não é compatível com o regime constitucional brasileiro, em que a coisa julgada se encontra protegida contra a atuação legislativa e, com mais razão, contra a atuação jurisdicional extemporânea. Ao permitir que entendimentos posteriores revoguem decisões já estabilizadas, o STF está relativizando um direito fundamental consagrado textualmente e intangível por força do art. 60, §4º, IV da CF/88.

Essa relativização produz efeitos gravíssimos de insegurança jurídica. Situações concretas ilustram isso:

a) Um contribuinte que teve reconhecido, por decisão transitada em julgado, o direito de não pagar determinado tributo, pode ser surpreendido anos depois com a exigência retroativa desse mesmo tributo, em razão de nova tese firmada pelo STF. Claro que o oposto também é verdadeiro, contudo alguém tem alguma dúvida de que isso nunca vai acontecer?

b) Um servidor público que teve seu direito reconhecido por sentença definitiva pode ter sua aposentadoria questionada com base em nova orientação jurisprudencial que vier posteriormente;

c) Empresas que deixaram de recolher encargos com base em decisão judicial com coisa julgada passam a ser cobradas retroativamente, com juros e multa, em cenário de absoluta insegurança.

Além de injusto, esse cenário enfraquece o valor da jurisdição como instrumento de pacificação social e compromete o próprio papel do Poder Judiciário. A coisa julgada, concebida como garantia do jurisdicionado contra a eternização de litígios e contra a instabilidade decisória, torna-se frágil, instável e relativizável por critérios alheios ao devido processo legal.

A tese do Tema 881 rompe com o princípio da segurança jurídica, que é estruturante do Estado de Direito, e também com o princípio da irretroatividade da norma mais gravosa, pois permite que decisões posteriores impactem fatos consumados à luz da jurisprudência então vigente. É, portanto, uma violação múltipla à Constituição: ao art. 5º, XXXVI (coisa julgada), ao art. 60, §4º, IV (cláusula pétrea) e ao devido processo legal substancial (art. 5º, LIV).

Em suma, o Tema 881 inaugura uma lógica segundo a qual nenhuma decisão é, de fato, definitiva, pois está sempre sujeita à revisão por mudança de entendimento jurisprudencial. Essa concepção desfigura o próprio conceito de coisa julgada, transforma o STF em instância recursal eterna e compromete a credibilidade do sistema judicial como um todo.

"As decisões do STF em controle concentrado ou em repercussão geral devem ser observadas pelos juízes e tribunais, ainda que em detrimento da coisa julgada."

O entendimento permite que uma decisão judicial definitiva perca sua eficácia caso contrarie tese posterior do STF.

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