segunda-feira, 19 de agosto de 2013

IMPRESSÕES SOBRE O LIVRO ANNA KARIÊNINA.

Por Ewerton Pacheco.


A leitura do livro “Anna Kariênina”, de Tolstói, me deixou tão impressionado, que decidi escrever algo a respeito dessa obra, para talvez inspirar quem ainda não teve o prazer de conhecer o trabalho desse grande autor.

O livro tem como história principal o caso extraconjugal de Anna Kariênina, em uma época em que isso era um tabu ainda maior do que hoje. Durante e após a leitura, fiquei me indagando sobre quem seria culpado(a) pela traição da Anna. Seria o esposo, por não dar a atenção necessária? Seria a Anna, por ser uma depravada sexual? Seria o amante, por tê-la seduzido? Seria a tia da Anna, por ter mexido os pauzinhos para casá-la? 

O fato é que Tolstói, de maneira impressionantemente hábil, apresenta toda a história da perspectiva de todos os envolvidos. Ele mostra a visão de outras pessoas, e também a visão pessoal. Mostra as impressões causadas e o que se passa de verdade dentro da alma dos personagens. Aliás, os personagens são baseados em pessoas reais, e o final da história também teve como origem um acontecimento testemunhado pelo nosso grande autor. 

Considero um livro genial, apesar de não considerá-lo um livro divertido, tal como O Senhor dos Anéis, O Hobbit e Musashi. Talvez essa minha impressão seja causada porque me identifiquei muito com um dos personagens, Liévin. Estimo que 80% da sua personalidade se equivale à minha. Muitos dos “dramas internos” que ele vive, o autor descreve com detalhes que são assombrosamente iguais aos que já vivi.

Mas, não me identifiquei só com um personagem. Há passagens nas vidas de outros integrantes da história que descrevem muito bem a maneira como pensei ou me senti em alguns momentos. Esta passagem, por exemplo, relacionada a um personagem que se viu livre de um problema que o incomodava havia muito tempo: 

“Experimentou a sensação de um homem a quem arrancam um dente que doía há muito tempo. Após a dor terrível e a sensação de que algo enorme, maior do que a própria cabeça, foi extraído do maxilar, o paciente de súbito, ainda sem acreditar na sua felicidade, percebe que não existe mais aquilo que por tanto tempo envenenou sua vida, imobilizou toda sua atenção sobre si mesmo, e sente que pode novamente viver, pensar e interessar-se não apenas por seu dente. Foi esse o sentimento que o PERSONAGEM experimentou. A dor foi estranha e terrível, mas agora havia passado; sentia que podia de novo viver e pensar não apenas EM SEU PROBLEMA”. Note que não indiquei nem o personagem e nem qual é o problema, para não retirar o interesse de um eventual leitor interessado.

Outra passagem interessante ocorreu quando Tolstói apresenta a história de um personagem que queria muito uma coisa, que moveu o Mundo para conseguir o que queria. Ocorre que, quando conseguiu, se sentiu frustrado, porque sua felicidade foi bem menos intensa do que imaginara – como costuma acontecer (nas palavras do autor) a “Todas as pessoas que baseiam sua felicidade na satisfação dos seus desejos”. Não posso deixar de identificar aqui uma conexão com o budismo, que tem como um de seus dogmas isto: “O sofrimento decorre do desejo”. No caso específico, entendo que a grande expectativa gerada pelo desejo acabou trazendo a frustração experimentada pelo personagem; e o dogma do budismo a que me referi acabou se mostrando verdadeiro com uma grande clareza para mim.

Lembro-me de um outro personagem de outro grande livro do Tolstói, Guerra e Paz. Também me identifiquei intensamente com ele. Houve uma passagem bem interessante entre o mencionado personagem e sua esposa: Esta, sentindo-se insegura, perguntou ao esposo se ele a amava, pois não dava frequentes demonstrações de seu amor. Ao ser questionado, falou algo parecido com isto: “Amo-te. Porém, amo como amo meu dedo mindinho... Às vezes, até me esqueço que ele existe. Porém, deixe alguém tentar decepá-lo, que verá o que faço”. Essa passagem me marcou bastante porque normalmente é assim que me sinto com relação às pessoas mais próximas (familiares e amigos). Não costumo ter uma injeção de adrenalina e endorfina ao encontrá-los após muito tempo de afastamento, tampouco entro em um estado de êxtase, com ataques de histeria (nada contra quem tem essas reações). É claro que aprecio a companhia de amigos e familiares, porém meu estado psíquico se altera muito pouco em comparação ao modo como estaria caso estivesse sozinho. Não digo que estou certo ou errado ao modo de sentir. Só digo que é assim que me sinto, e que o autor descreveu isso com minúcias.

Entendo que ler Tolstói é de certa forma uma jornada de autoconhecimento. Não dá para dissociá-lo de nossas experiências pessoais.

Mas, de qualquer modo, voltando à questão inicial deste texto: “Quem foi culpado(a) pela traição da Anna?”. Minha impressão é a seguinte: O que aconteceu tinha que ter acontecido, e de qualquer modo teria acontecido, por conta das condições psicológicas de cada personagem. Não houve um culpado específico. Houve uma confluência de condições que acarretaram no único resultado possível. Doa a quem doer, sofra quem sofrer. 

Encerro meu texto com as palavras da Anna Kariênina: “Há tantas maneiras de amar quantas pessoas existem neste Mundo”.

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