sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Carol Castro e o terço.

No caso muito difundido sobre o uso do terço na mão da atriz Carol Castro em uma das fotos que tirou para a revista Playboy, muitos vieram com a pergunta sobre o artigo 208 do Código Penal que diz o seguinte.

Ultraje a Culto e Impedimento ou Perturbação de Ato a Ele Relativo
Art. 208 - Escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa.

Inicialmente temos que pensar no preceito constitucional que fomenta a existência desse artigo, no caso a continuidade de sua vigência já que ele é anterior à Constituição de 1988.

Esse artigo está no Código Penal desde seu nascedouro, ou seja, desde 1940, e antes, nos demais Códigos e legislações esparsas sobre o tema, tivemos sempre essa figura rondando as normas penais, de uma forma ou de outra. Tudo isso para que se garanta o direito certo de crença religiosa que é princípio básico de qualquer democracia certa.

Antes de sermos uma República a religião era questão de ordem estatal e social, portanto, não é muito difícil de chegar á conclusão de que um artigo como esse teria total e plena valia.

Voltando à Constituição, temos o seguinte no artigo Art. 5º, VI

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

O artigo do Código Penal, portanto, simplesmente deu interpretação e disciplinou a norma constitucional. Nada de inconstitucionalidade há, dessa feita, no artigo do Código Penal. Faço essa alusão à inconstitucionalidade justamente porque sabemos que tudo pode acontecer e todos os argumentos podem vir quando o assunto é ataque religioso.

Vamos então ao citado artigo 208 do Código Penal. A nossa literatura doutrinária a respeito desse artigo não é lá essas coisas. Poucos são os que se aprofundam nesse tema. É um caso a se pensar: porque será? A primeira resposta que me vem `cabeça é a de que o artigo é muito pouco usado, apesar de vermos acontecer todo dia. Minha resposta começa a ficar mais clara e começo a convencer a mim mesmo de que estou certo quando vou pesquisar na jurisprudência. Dificilmente se acha alguma coisa a respeito. Claro que temos jurisprudências sobre o assunto, mas a quantidade é ínfima e não é possível abranger boa parte dos casos.

Vemos que o artigo, claramente protege o sentimento religioso, independente da religião professada, bem como a liberdade de culto. Essa é, resumidamente a objetividade jurídica da norma.

Nossa dúvida fica no seguinte: até onde o sentimento religioso vai e conde começa o sentimento social? Da mesma forma, até onde os símbolos litúrgicos católicos, como é o caso concreto, deixam de ser símbolos católicos para serem símbolos culturais? Essa pergunta qualquer julgador se faria no momento de julgar o vilipêndio.

O vilipêndio, ou seja, o desrespeito aconteceu com qual objetividade? Havia realmente a intenção de vilipendiar ou simplesmente havia a intenção de ornamentar a fotografia ou mesmo utilizar do símbolo no sentido literário de Jorge Amado, como alega a atriz? Será que tudo é possibilitado desde que seja feito pela arte e para a arte?

A conduta do artigo pode ter algumas modalidades e uma delas é vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso.

Contado um pouquinho de história, pois o direito é basicamente história, assim não corremos o risco de um odiado positivismo no sentido de legalismo sem motivo. O vilipêndio é a antiga forma legal do sacrilegium. Não preciso traduzir nem remeter a tempos históricos para afirmar que praticamente toda a nossa estrutura jurídica vem da religião Católica que, por sua vez, assumiu alguns preceitos da antiguidade, época de sua formação.

O vilipêndio pode ser: real, verbal ou escrito. Em nosso caso particular, admitindo que houve o crime, deveria ser inserido no vilipêndio real. Outra questão que é requisito para o crime é o ato ser realizado em público e na presença de várias pessoas. Ora, sair na playboy é mais do realizar em público, é quase realizar o ato em cadeia nacional.

O ato pode ser realizado dentro ou fora do templo. Claro que foi realizado fora do templo em estúdio fotográfico ou mesmo em ambiente decorado para tal atitude.

Agora deveremos definir o que é objeto de culto. Bem, parece, a primeira vista, algo muito fácil de se fazer, contudo não é lá essa facilidade toda. Por exemplo, um altar é objeto de culto? Sim, para quem sabe o que é o culto. Se um desavisado sentar sobre um altar montado em praça pública para a celebração de uma missa, não comete, a meu ver o crime. Não se trata de relativismo, mas sim de lógica. Não se pode cometer um crime se não há a mínima possibilidade de saber que o objeto do crime é o que realmente é. Em outras palavras, não é possível vilipendiar algo que não se sabe nem que significado tem para o ofendido.

Por outro lado, um terço, obviamente é objeto de culto. Não há dúvidas, há? Não é, por exemplo, como os bancos da Igreja. Os bancos estão na Igreja, mas só servem para o mesmo fim de um banco de praça pública, ou seja, sentar. Um terço não serve para outra coisa que não seja a oração de um fiel Católico. Se há outra conotação para o terço, por favor, os mais sabidos me informem e me mostrem porque.

Quem não se lembra do caso esdrúxulo do pastor da Universal do Reino de Deus que chutou N. Sra. Aparecida? Naquele momento houve total desrespeito a objeto de culto e o pastor desrespeitoso incorreu no crime contido no artigo 208 do Código Penal.

Concluindo, penso que, já que não há qualquer consenso dos Tribunais Estaduais sobre esse artigo do Código Penal, muito menos nos Tribunais Superiores, necessário seria que os Católicos começassem a criar essas jurisprudências. Não falo nem tanto relativamente ao artigo 208 do Código Penal que seria mais uma atitude do Ministério Público com seus promotores de justiça, que muitas não fazem esse tipo de promoção e dos seus procuradores, que não estão encontrando muita coisa que não as câmeras de TV.

Enfim, no direito civil temos o instituto da indenização por dano moral. Os Católicos foram nitidamente ofendidos com o fato, portanto caberia indenização por dano moral, isso, mais uma vez afirmo, se trata de minha ínfima opinião que, perto de nossos semi-deuses de toga não vale lá muita coisa.

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