sexta-feira, 16 de agosto de 2024

Reflexões sobre alguns princípios do processo civil brasileiro.

 

Os princípios processuais civis no âmbito do sistema judicial brasileiro constituem a base normativa e axiológica que orienta o funcionamento do processo civil com um todo, sendo fundamentais para garantir a efetividade da justiça e a proteção dos direitos dos litigantes. Esses princípios, consagrados tanto na Constituição Federal quanto no Código de Processo Civil (CPC), ou mesmo não constando em nenhuma lei específica, mas que fazem parte do fundamento mais primário que vem antes de qualquer positivação, servem como guias interpretativos e como limites à atuação das partes e do próprio Judiciário. Contudo, a real importância e aplicabilidade desses princípios são temas que merecem uma análise crítica, especialmente no contexto da prática jurídica cotidiana. 

A Função dos Princípios Processuais 

Os princípios processuais não são meros adornos teóricos, muito menos enfeites ideológicos que não devem ser levados em consideração; eles desempenham um papel essencial na estruturação do processo civil. Princípios como o contraditório, a ampla defesa, a igualdade das partes, a motivação das decisões judiciais, a celeridade processual, e a inafastabilidade da jurisdição são, em teoria, os pilares sobre os quais se edifica um processo justo e eficaz. Obviamente que não se diminui a necessidade de observância nem a importância de tantos outros princípios, cada doutrinador terá uma lista cm alguns princípios faltantes em outras listas, mas aqui tratamos apenas o verdadeiro núcleo dos princípios no processo civil. 

1.      Contraditório e Ampla Defesa: Esses princípios garantem que ambas as partes tenham a oportunidade de se manifestar sobre os fatos e as provas do processo, assegurando a paridade de armas. Na prática, a violação desses princípios pode levar à nulidade processual quando realmente comprovados, o que reforça sua importância.

2.      Motivação das Decisões Judiciais: Este princípio assegura que as decisões sejam fundamentadas, permitindo às partes compreender as razões do julgamento e viabilizando a interposição de recursos. O julgador não pode impor sua decisão pelo simples fato de assim o querer sem explicar os motivos pelos quais deve fazê-lo. Sua aplicabilidade prática é crucial para a transparência e para a legitimidade das decisões judiciais.

3.      Celeridade e Economia Processual: Estes princípios visam garantir que o processo seja conduzido de forma rápida e econômica, evitando que a morosidade judicial comprometa o direito material das partes. No entanto, a realidade forense brasileira frequentemente mostra que esses princípios são mais ideais do que práticas concretas, com processos que se arrastam por anos devido a uma série de fatores estruturais e procedimentais. Sob o mesmo prisma, não se pode, de forma alguma, intentar celeridade ao processo deixando de lados outros princípios essenciais como a eficiência, o contraditório e ampla defesa. Celeridade é importante, mas não é tudo em um processo. Deve-se entender que todo processo tem sua cadência e o bom senso sempre ajuda nessas questões. 

Crítica à Aplicabilidade dos Princípios. 

Embora os princípios processuais sejam fundamentais, sua aplicação prática muitas vezes enfrenta desafios e não são quaisquer desafios. A morosidade processual, a sobrecarga do Judiciário, e as dificuldades de acesso à justiça refletem uma desconexão entre o ideal normativo e a realidade jurídica. A falta de juízes em número necessário para o volume de processos também é um desafio, especialmente no primeiro grau de jurisdição. O desafio humano de não mecanizar decisões é outro problema crescente, especialmente em tempos de processo digital, cobrança de rapidez e inteligência artificial. 

1.      Contraditório e Ampla Defesa na Prática: Embora sejam direitos garantidos, o efetivo exercício do contraditório e da ampla defesa pode ser comprometido em contextos de desigualdade socioeconômica, onde uma das partes não dispõe dos recursos necessários para uma defesa adequada. Além disso, a complexidade técnica de algumas demandas pode dificultar o pleno exercício desses direitos.

2.      Celeridade Processual: A celeridade processual é um princípio que frequentemente esbarra na burocracia e na escassez de recursos do sistema judiciário ou mesmo na morosidade de servidores ou interesses escusos de algumas partes. A sobrecarga de processos resulta em uma justiça que, muitas vezes, é tardia e, por isso, falha.

3.      Inafastabilidade da Jurisdição e Acesso à Justiça: O princípio da inafastabilidade da jurisdição garante que nenhuma lesão ou ameaça a direito pode ser excluída da apreciação judicial. No entanto, o acesso à justiça ainda é uma questão problemática, especialmente para as camadas mais vulneráveis da sociedade, que enfrentam barreiras econômicas e sociais para acessar o Judiciário, não por falta de acesso físico, mas por falta de entendimento, de confiança, de condição financeira para contratação de um bom procurador etc.

4.      Motivação das Decisões: A exigência de fundamentação nas decisões judiciais é essencial para garantir a transparência e a justiça do processo. No entanto, decisões excessivamente sucintas ou padronizadas, mesmo aquelas sem fundamentação nenhuma comprometem esse princípio, frustrando as expectativas das partes e dificultando o controle recursal. 

Os princípios processuais civis brasileiros são indispensáveis para a construção de um processo justo, equilibrado e eficaz. No entanto, sua real importância só se concretiza na medida em que são efetivamente aplicados e respeitados na prática. A distância entre o ideal normativo e a realidade prática revela a necessidade de reformas estruturais e de um compromisso contínuo com a efetivação desses princípios, para que o processo civil cumpra sua função de instrumento de realização da justiça. Sem isso, os princípios correm o risco de se tornarem apenas declarações formais, idealismos desprovidos de real impacto na vida dos cidadãos e na credibilidade do sistema judiciário.

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