quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Instrução Immensae Caritatis

A instrução Immensae Caritatis, do Papa São Paulo VI foi publicada no ano de 1973 e é o documento que, entre outras coisas, criou e regulamentou a função ou ofício de Ministro Extraordinário da Sagrada Comunhão.

Trata-se de um documento de importante leitura, especialmente para aqueles que são ministros da comunhão. Infelizmente a maioria esmagadora dessas pessoas que são instituídas como ministros extraordinários da comunhão nunca leram o documento abaixo, seja por falta de acesso a essa informação, seja por falta de interesse. A questão é que a formação dessas pessoas precisa acontecer da forma mais profunda e urgente possível, uma vez que são leigos que estão muito próximos da Eucaristia e isso não é qualquer coisa.

Dessa forma, e com esses cuidados, desejo a todos uma boa leitura.

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 IMMENSAE CARITATIS

Sobre a Facilitação da Recepção da Comunhão em certas circunstâncias

Sagrada Congregação dos Sacramentos

Dado em 29 de Janeiro de 1973

 

A prova da ilimitada caridade que Cristo, o Senhor, deixou à sua Esposa, a Igreja, qual seja, o inexprimível e supremo dom da Eucaristia, requer de nós que aprofundemos nossa apreciação desse grande mistério e compartilhemos ainda mais plenamente de seu poder salvífico. Consequentemente, a Igreja, em seu zelo e cuidado pastoral, tem repetidamente elaborado leis práticas e declarações doutrinais adequadas, objetivando o aumento na devoção pela Eucaristia, o cume e o centro do culto Cristão.

As novas condições do presente parecem exigir que, sem prejuízo da suprema reverência devida a tão excelso sacramento [1], o acesso à Comunhão seja facilitado, de modo que, pela participação mais plena nos efeitos do sacrifício da Missa, os fiéis possam, mais prontamente e intensamente, entregarem-se a Deus, e ao bem da Igreja e de toda a humanidade.

As primeiras medidas a serem tomadas objetivam evitar que a recepção da Comunhão se torne impossível ou difícil pela falta de um número suficiente de ministros. Medidas devem ser tomadas, em segundo lugar, para prevenir a exclusão dos doentes desse grande conforto espiritual, a recepção da Comunhão, devido à impossibilidade de observar a lei do jejum, mesmo em sua forma menos severa. Finalmente, parece vantajoso, em certos casos, permitir aos fiéis solicitantes receber a Comunhão uma segunda vez no mesmo dia.

Em resposta, portanto, às preferências de várias Conferências de Bispos, as seguintes normas são emitidas, com relação a:

1. ministros extraordinários para a distribuição da comunhão;

2. permissão mais ampla para a recepção da Comunhão duas vezes no mesmo dia;

3. mitigação do jejum eucarístico em favor dos doentes e idosos;

4. devoção e reverência com relação ao Sagrado Sacramento, quando a hóstia é distribuída nas mãos.

 

I. Ministros Extraordinários da Eucaristia

 

Há várias situações nas quais uma deficiência no número de ministros da Comunhão tem sido apontada:

– na Missa, devido a um grande número de pessoas ou alguma impossibilidade do celebrante;

– fora da Missa, quando a distância torna difícil levar a Comunhão, especialmente como viático aos doentes em perigo de morte; ou quando o grande número de pessoas doentes, especialmente em hospitais ou instituições similares, requer vários ministros.

A fim de que, então, os fiéis que estão em estado de graça e retamente e devotamente desejem participar do banquete sagrado não fiquem privados desse conforto e remédio sacramental, o Papa Paulo VI decidiu ser oportuno autorizar ministros extraordinários, que serão designados para dar a Comunhão a si mesmos e aos outros fiéis, sob as exatas e específicas condições aqui listadas.

I. Os Ordinários locais possuem a faculdade que os capacita a permitir que pessoas aptas, cada uma delas cuidadosamente escolhida como ministro extraordinário, em um dado momento ou por um período determinado ou mesmo permanentemente, possam distribuir a Comunhão a si mesmas e aos outros fiéis, e levá-las aos enfermos residentes em casa:

a. quando não houver padre, diácono ou acólito disponível;

b. quando os mesmos ministros estiverem impossibilitados de administrar a Comunhão, por causa de outra atividade pastoral, ou em caso de doença ou idade avançada;

c. quando o número de fiéis desejosos de receber a Comunhão for tão grande que a celebração da Missa ou a distribuição da Comunhão fora da Missa demoraria excessivamente.

II. Os mesmos Ordinários locais detêm a faculdade de conceder a padres individualmente, no decurso de seu ministério, o poder de apontar, para uma dada ocasião, uma pessoa apta para distribuir a Comunhão em casos de genuína necessidade.

III. Os Ordinários locais podem também delegar essas faculdades a Bispos auxiliares, Vigários Episcopais e Delegados Episcopais.

IV. A pessoa apta referida nos itens I e II será designada de acordo com a ordem dessa lista (que pode ser modificada segundo o prudente critério do Ordinário local): leitor, seminarista maior, religioso masculino, religiosa feminina, catequista, um dos fiéis homem ou mulher.

V. Nos oratórios das comunidades de religiosos, tanto masculinas quanto femininas, o encargo de distribuir a Comunhão nas circunstâncias listadas no item I pode, com justiça, ser concedido ao superior não-ordenado da ordem religiosa masculina ou à superiora da ordem feminina ou aos seus vigários.

VI. Se houver oportunidade, é aconselhável que a pessoa apta escolhida pelo Ordinário local como ministro da Comunhão e a pessoa, referida no item II, apontada pelo sacerdote detentor dessa faculdade, venha a receber uma autorização (<mandatum>) de acordo com o rito anexado a esta Instrução [2]. Esse ministro deve realizar a distribuição da Comunhão de acordo com as normas litúrgicas.

Já que essas faculdades foram concedidas exclusivamente em favor do bem espiritual dos fiéis, e para casos de genuína necessidade, lembrem-se os sacerdotes que tais faculdades não os isentam da obrigação de distribuir a Eucaristia aos fiéis que legitimamente o solicitarem, e especialmente de levá-la e administrá-la aos doentes.

Os fiéis que são ministros extraordinários devem ser pessoas cujas boas qualidades de vida cristã, de fé e de moral os recomende. Que se esforcem para serem dignos desse importante cargo, que fomentem a própria devoção à Eucaristia, e mostrem ser um exemplo para o resto dos fiéis, pela sua própria devoção e reverência com relação ao mais augusto sacramento do altar. Não deve ser escolhido ninguém cuja nomeação possa ser causa de inquietação para os fiéis.

 

2. Uma Possibilidade Mais Ampla Para Receber a Comunhão Duas Vezes no Mesmo Dia

 

A disciplina atualmente em vigor permite aos fiéis receber a Comunhão uma segunda vez no mesmo dia:

– no sábado à noite ou na noite da véspera de um dia santo de preceito, quando estão cumprindo a obrigação de assistir a Missa, mesmo que já tenham recebido a Comunhão naquela manhã; [3]

– na segunda Missa do Domingo de Páscoa, e em uma das Missas do Dia no Natal, mesmo que já tenham recebido a Comunhão na Missa da Vigília Pascal ou na Missa da Meia-noite (do Galo) no Natal; [4]

– também na Missa da noite na Quinta-feira Santa, mesmo que já tenham recebido a Comunhão na Missa do Crisma (ou dos Santos Óleos). [5]

Além das listadas, há outras situações do mesmo tipo que favorecem uma Segunda Comunhão. As razões para a concessão de uma nova permissão devem, portanto, ser aqui demonstradas em detalhe.

Como mãe providente, a Igreja estabeleceu, a partir de prática multissecular, e acolheu em seu Código de Direito Canônico, uma norma segundo a qual é permitido ao fiel receber a Comunhão apenas uma vez ao dia. Essa norma permanece inalterada, e não deve ser desconsiderada simplesmente por razões de devoção. Qualquer mal-recomendado desejo de repetir a Comunhão deve ser contido pela verdade de que quanto mais devotamente a pessoa se aproxima da mesa sagrada, maior o poder do sacramento que alimenta, fortalece, e expressa fé, caridade, e todas as demais virtudes. [6] Por isso os fiéis devem dar prosseguimento à celebração litúrgica realizando obras de caridade, de religião e de apostolado, de modo que aquilo que receberam pela fé e pelo sacramento na celebração da Eucaristia seja confirmado pela maneira com que vivem. [7]

Entretanto, podem ocorrer circunstâncias especiais nas quais os fiéis que já receberam a Comunhão no mesmo dia, ou nas quais padres que já celebraram a Missa, comparecem a alguma celebração da comunidade. Será permitido a esses fiéis e a esses padres receber a Comunhão uma segunda vez nas seguintes situações:

1. em Missas rituais nas quais os sacramentos do batismo, confirmação, unção dos enfermos, ordenação, e matrimônio são administrados, bem como em Missas nas quais haja uma primeira comunhão; [8]

2. em Missas pela consagração de uma Igreja ou um altar, por uma profissão religiosa, ou pela outorga de uma missão canônica;

3. nas Missas pelos falecidos por ocasião de um funeral, anúncio de falecimento, enterro final, ou primeiro aniversário de falecimento;

4. na Missa principal celebrada em uma Catedral ou Igreja paroquial na solenidade de Corpus Christi e no dia de uma visita pastoral; em uma Missa celebrada por ocasião da visita canônica de um superior geral de uma congregação a uma casa religiosa particular, ou capítulo;

5. na Missa principal de um Congresso Eucarístico ou Mariano, seja internacional ou nacional, regional ou diocesano;

6. na Missa principal de qualquer tipo de encontro, peregrinação, ou missão popular;

7. na administração do viático, quando a Comunhão for dada aos membros da casa e aos amigos da pessoa doente que estejam presentes.

8. Além dos casos já mencionados, permite-se ao Ordinário local conceder, para uma única ocasião, a faculdade de receber a Comunhão duas vezes no mesmo dia em qualquer tempo, devido a circunstâncias especiais. Uma segunda recepção está autorizada com base nesta Instrução.

 

3. Mitigação do Jejum Eucarístico em Favor dos Doentes e dos Idosos

 

Primeiramente, permanece firme e estabelecido que ao fiel para o qual é administrado o viático em perigo de morte não cabe nenhum preceito de jejum. [9] Também continua em vigor a concessão feita por Pio XII com base na qual os doentes, mesmo não acamados, podem, sem qualquer limitação temporal, ingerir bebidas não-alcoólicas e medicação líquida ou sólida antes de celebrar a Missa e antes de receber a Comunhão. [10]

E, com relação à comida e bebida tomadas enquanto nutrição, deve ser mantida aquela tradição segundo a qual a Eucaristia deve ser recebida antes de qualquer comida, como diz Tertuliano, [11] como sinal da excelência desse alimento sacramental.

Para dar reconhecimento à dignidade do sacramento, e para aumentar o júbilo na recepção do Senhor, apraz observar um período de silêncio e recolhimento. É um adequado sinal de devoção e respeito da parte dos doentes se eles direcionam suas mentes, por um curto período de tempo, para esse grande mistério. A duração do jejum eucarístico, ou seja, da abstenção de comida ou de bebida alcoólica, é reduzida a aproximadamente um quarto de hora para:

1. os doentes nos estabelecimentos de saúde ou em casa, mesmo não estando acamados;

2. os fiéis de idade avançada, quer estejam confinados em suas casas devido à idade, ou quer vivam em abrigos para idosos;

3. padres doentes, mesmo se não acamados, e padres mais idosos, com relação tanto a celebrar a Missa quanto a receber a Comunhão;

4. os cuidadores, bem como familiares e amigos, dos doentes e idosos que desejarem receber a Comunhão com eles, quando tais pessoas estiverem impossibilitadas de manter o jejum de uma hora sem inconvenientes.

 

4. Devoção e Reverência Para com a Eucaristia no Caso da Comunhão nas Mãos

 

Desde a Instrução Memoriale Domini, há três anos atrás, algumas das Conferências de Bispos têm solicitado à Sé Apostólica a faculdade de permitir que os ministros que distribuem a Comunhão possam colocar o pão eucarístico nas mãos dos fiéis. A mesma Instrução continha um lembrete de que as leis da Igreja e os escritos dos Padres dão amplo testemunho de uma suprema reverência e máximo cuidado para com a Eucaristia, [12] e de que isso deve continuar. Particularmente com relação a essa maneira de receber a Comunhão, a experiência sugere certas dificuldades que requerem cuidadosa atenção.

Sempre que a hóstia for colocada nas mãos de um comungante, deve haver meticulosa atenção e cuidado, tanto da parte do ministro quanto do receptor, especialmente com relação às partículas que podem cair das hóstias.

A prática da Comunhão nas mãos deve ser acompanhada por instruções apropriadas ou catequeses sobre o ensinamento católico com relação à presença real e permanente de Cristo sob os elementos eucarísticos, e sobre a reverência devida a esse sacramento. [13]

Os fiéis devem ser ensinados que Jesus Cristo é Senhor e Salvador e que, portanto, o culto de <latria> ou adoração devido a Deus é devido também a Cristo presente nesse sacramento. Eles devem também ser instruídos a não omitir, depois da Comunhão, aquela sincera e apropriada ação de graças, conforme suas capacidades, estado e ocupações individuais. [14]

Finalmente, a fim de que sua participação nessa mesa celestial seja plenamente digna e frutuosa, o fiel deve ser instruído sobre seus benefícios e efeitos, tanto para o plano individual quanto para a sociedade, de modo que seu relacionamento familial com o Pai que nos dá seu pão de cada dia, [15] possa refletir a máxima reverência para com Ele, educar para o amor, e levar a um elo vivo de ligação com Cristo, em cujo Corpo e Sangue comungamos. [16]

O Papa Paulo VI aprovou esta Instrução, confirmou-a com sua autoridade, e ordenou sua publicação, fixando o dia de sua entrada em vigor no dia de sua publicação.

 

---------------------------------------------------Notas

 

1. Ver o Concílio de Trento, sessão 13, <Decretum de SS. Eucharistiae Sacramento> cap. 7: Denz-Schon 1646-47: “É inadequado tomar parte em qualquer função sagrada sem santidade. Seguramente, portanto, quanto mais os cristãos percebem a sacralidade e a divindade desse celestial sacramento, tanto mais devem tomar todos os cuidados para não vir a recebê-lo sem reverência e santidade, especialmente quando temos as assustadoras palavras de São Paulo: Aqueles que comem e bebem sem estarem preparados, comem e bebem sua própria condenação, não discernindo o Corpo do Senhor (1 Cor 11, 29). Aqueles que desejam receber a Comunhão devem lembrar-se do mandamento de São Paulo: Examine a si mesmo (1 Cor 11, 28). O costume da Igreja torna claro que tal exame é necessário porque aqueles conscientes de pecado mortal, não importa quão contritos se considerem, não devem dirigir-se à Eucaristia sem antes passar por uma confissão sacramental. Este Concílio decreta que, quando há confessores disponíveis, essa prática deve ser sempre observada por todos os cristãos, incluindo os sacerdotes, obrigados por ofício a celebrar a Missa. Um sacerdote que, em caso de necessidade, tenha celebrado Missa sem antes ter se confessado, deve ir confessar-se logo que possível. Ver também Congregação do Concílio, Decr. <Sacra Tridentina Synodus>, 20 de dezembro de 1905: AAS 38 (1905-06) 400-406. Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, <Normas Pastorais acerca de dar Absolvição Sacramental Geral>, 16 de junho de 1972. Norma 1.

2. A edição típica <editio typica> desse rito foi publicada separadamente.

3. Ver Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. <Eucharisticum Mysterium>, 25 de maio d e 1967 nº 28.

4. ver Ibid.

5. Ver Ibid.; Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. <Inter Oecumenici>, 26 de setembro de 1964, nº 60; Instr. <Tres Abhinc Annos>, 4 de maio de 1967, nº 14.

6. Ver <Summa Theologica> 3a, 79.7 ad3; 8 ad 1.

7. Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. <Eucharisticum Mysterium>, nº 13.

8. Ver IGMR nº 329.

9. Ver Código de Direito Canônico <Codex Iuris Canonici> can. 858, #1.

10. Pio XII, Motu Proprio <Sacram Communionem>, 19 de março de 1957, nº 4; AAS 49 (1957) 178.

11 Tertuliano, <Ad uxorem> 2,5: PL 1, 1408.

12. Sagrada Congregação para o Culto Divino, Instr. <Memoriale Domini>, 29 de maio de 1969 que permanece em vigor.

13. Ver <Sacrosanctum Concilium> art. 7. Sagrada Congregação dos Ritos, Instr. <Eucharisticum Mysterium> nº 9. Sagrada Congregação para o Culto Divino, Instr. <Memoriale Domini>, as palavras eles devem evitar que crie raízes nas mentes das pessoas qualquer possível falta de reverência ou falsas opiniões sobre a Eucaristia.

14. Ver Paulo VI, Carta aos membros do Conselho Permanente de Congressos Eucarísticos Internacionais.

15. Ver Lc 11, 3.

16. Ver Heb 2, 14.

 

terça-feira, 13 de setembro de 2022

Caráter extraordinário dos ministros extraordinários da Comunhão Eucarística.

Parece de bom tom iniciar um texto como esse citando o que vem a ser extraordinário e o que é ordinário em função da Eucaristia. Até porque a confusão nesse campo só aumenta a cada dia. De acordo com o cânon 910 §1 do CIC de 1983, são ministros ordinários da comunhão o bispo, o presbítero e o diácono. Perceba que aqui foram citados apenas aqueles que são clérigos. No mais, na reforma posterior ao Concílio Vaticano II se incorporou ao direito da Igreja um novo conceito quando se tem em vista o direito anterior. Esse é o conceito de Ministro Extraordinário da Sagrada Comunhão. Veja-se que houve essa introdução, como citaremos a seguir, depois do fim do Concílio, portanto não foi uma determinação do Concílio, talvez uma consequência da interpretação dele. Se certo ou se errado não é meu interesse aqui analisar. Essa análise fica para outro dia.

A figura do ministro extraordinário extraordinário da Sagrada Comunhão - MESC, foi introduzida em 1973 pela Instrução Immensae Caritatis da então Congregação para a Disciplina dos Sacramentos, hoje Dicastério. A publicação se deu em 29 de janeiro de 1973 (AAS 65 (1973) 265-266).

Após isso tivemos vários outros documentos falando sobre os MESCs: Instrução Redemptionis Sacramentum, Instrução sobre alguma questões que se devem observar sobre a Santíssima Eucaristia, publicações do Pontifício Conselhos para Interpretação dos Textos Legislativos e o próprio Código de Direito Canônico - CIC.

As recentes manifestações da Santa Sé sempre insistem em deixar claro o caráter extraordinário dessa função. Por isso, em outro ponto a Instrução Redemptionis Sacramentum, para evitar confusões sobre a função dos leigos (laicos) na Eucaristia, deixa claro que se deve usar a expressão Ministro da Comunhão e não Ministro da Eucaristia como muito ouvimos por aí:

"só o sacerdote validamente ordenado é ministro capaz de confeccionar o sacramento da Eucaristia, atuando in persona Christi". Por esse motivo o nome "ministro da Eucaristia" só se refere, propriamente ao sacerdote. (n. 154; cf. também n. 156).

Por tudo isso, o magistério da Igreja adiciona que para não provocar confusões que deverão ser sempre evitadas e práticas que devem sempre ser suprimidas, confusões e práticas essas que vem só aumentando com o passar dos anos nas Igrejas Particulares, a Igreja estabelece que não se deve:

- ter a comunhão dos MESCs como se fossem concelebrantes, porque não são;

- associar os MESCs na renovação das promessas dos sacerdotes na Santa Missa crismal da Quinta-Feira Santa;

- o uso habitual dos MESCs nas missas, estendendo arbitrariamente o conceito de "numerosa participação" (Instrução sobre algumas questões sobre a colaboração dos fiéis leigos, art, 8 §2).

Porque tenho problemas com a expressão "o espírito do concílio".

Muitas vezes ouço essa expressão "o espírito do concílio" para explicar coisas que parecem desconexas sobre liturgia, soteriologia, pastoralidade e até sobre o direito. Coisas que pretendem explicar não a doutrina, mas as concepções do interlocutor. O problema não é a palavra pela palavra, não é a expressão pela expressão. O problema é o uso da expressão para justificar o que muitas vezes é injustificável. Não se trata de se apegar a detalhes e minúcias, embora as minúcias sejam de extrema importância para a manutenção do todo, mas não se trata disso. 

A situação é a seguinte: usar o pretexto "espírito do concílio" para justificar o que o Concílio Vaticano II não falou é um crescente argumento de quem quer usar uma interpretação extrementemente subjetiva de algo que não foi dito. Por outro lado, usar a expressão para interpretar de forma amplíssima qualquer manifestação do concílio também não o melhor caminho, obviamente.

Ao perguntar o que vem a ser "o espírito do concílio" me informaram que é aquilo que os padres conciliares queriam dizer, queriam que fosse a interpretação. Seria como que a alma do concílio. Minha pergunta é: se queriam dizer, porque não disseram? Tantos debates, tantos esquemas de documentos, tantos assuntos aprovados e outros não, tantos anos para isso dentro do próprio Concílio, porque não disseram o que queriam dizer para que o rapaz que canta na missa das 19 do domingo usando bateria e ritmo rock argumenta? Argumenta, diga-se sustentado por tantos estudiosos, mesmo que inconcientemente. Porque essa alma parece ser tão diferente do corpo (escrito) de documentos do Concílio ao se ler o que temos de mais palpável? 

A interpretação acaba sendo feita não aos olhos do concílio, mas aos olhos, entendimentos e, porque não dizer, interesse de quem interpreta. Isso não é interpretação, isso é análise conforme o próprio interesse.

terça-feira, 27 de julho de 2021

Apostolicam Actuositatem e o apostolado leigo nas famílias (parte 04)

Continuando no Decreto Apostolicam Actuositatem, temos ainda no número 11 o seguinte trecho:

No governo da sociedade, tenham-se em conta as necessidades familiares quanto à habitação, educação dos filhos, condições de trabalho, seguros sociais e impostos. Ao regulamentar a migração salve-se sempre a convivência doméstica.

O governo da sociedade não é função de clérigos, nunca foi e só pode acontecer em situações extremas e extraordinárias. O governo da sociedade é função de leigos. Nós não deixamos de ser católicos quando entramos nesse meio e não governamos a sociedade só quando temos cargos eletivos como vereadores, prefeitos, governadores, deputados... Não é preciso ter cargo eletivo, ser “político” para ter função de governo da sociedade. Todos os que interferem de uma forma ou de outra na sociedade fazem o governo dela.

Entendendo isso, todos os que trabalham, atuam e se manifestam na sociedade auxiliam no governo dessa mesma sociedade de alguma forma. A questão aqui está em como devemos atuar. Nós vamos esquecer nossos valores religiosos quando atuamos ou vamos inserir isso na sociedade? É justamente isso que a Igreja pede a todos nós que somos leigos. Precisamos atuar na sociedade sem esquecer que somos católicos. Mais que isso, precisamos atuar na sociedade sem esquecer que cristianizar e santificar a sociedade é nossa função principal, ordinária.

É nesse ponto que o documento Apostolicam Actuositatem sugere a nossa interferência no que pareceu uma certa ordem de importância: primeiro as necessidades familiares de habitação e educação dos filhos. Depois as condições de trabalho seguros sociais e impostos.

Quando fala de necessidades de habitação e educação dos filhos, a Igreja espera tanto que o Estado interfira nisso apenas de forma subsidiária, ou seja, quando a família não conseguir resolver o Estado deve entrar para solucionar e já sair imediatamente do âmbito familiar após resolvida a situação , quanto que o Estado faça sua parte bem feita e sem interferências ideológicas quando for preciso fazer. Infelizmente não é isso que temos visto. Não temos visto nenhum tipo de subsidiariedade. O que temos visto é o Estado invadindo o âmbito familiar como um todo e nisso não estou falando só sobre o Brasil, é um fenômeno mundial.

As questões de trabalho, seguro social e impostos, da mesma forma, existem para que a sociedade seja servida deles e não que o Estado se sirva da sociedade e alguns privilegiados usem desse serviço. A medida que trabalhamos e vivemos para sustentar um estado que vai se tornando um peso e não uma solução subsidiária para os problemas mais gerais, nesse ponto o Estado está com sua função absolutamente deturpada.

Falamos bastante nesse ponto sobre subsidiariedade. Vamos explicar um pouco o que significa isso. Explicar rapidamente. A subsidiariedade é um princípio da Igreja que é muito usado pela Doutrina Social da Igreja e pelo Direito Canônico, entre outras áreas também. Quer dizer que a instância superior, mais forte ou hierarquicamente mais alta não deve interferir na instância inferior se essa instância inferior conseguir resolver o problema. Em outras palavras, significa que é melhor deixar para os menores grupos o máximo de resoluções possíveis. No âmbito da Igreja, a diocese não precisa entrar em problemas que a paróquia consegue resolver e a paróquia não precisa entrar em problemas que a família consegue resolver. Funciona da mesma forma para o Estado. O Estado não entrar no que a família consegue resolver sozinha.

segunda-feira, 26 de julho de 2021

Apostolicam Actuositatem e o apostolado leigo nas famílias (parte 03)

O Decreto Apostolicam Actuositatem, em seu número 11, lá pelo meio do parágrafo, manifesta nesses termos:

Foi sempre dever dos esposos e hoje é a maior incumbência do seu apostolado: manifestar e demonstrar, pela sua vida, a indissolubilidade e a santidade do vínculo matrimonial; afirmar vigorosamente o direito e o dever próprio dos pais e tutores de educar cristãmente os filhos; defender a dignidade e legítima autonomia da família.

Pelo lado dos pais, esposos, sempre há uma maior responsabilidade, afinal são mais velhos e tem o dever de educar na fé e na vida. Na fé é preciso que os pais façam o que hoje em dia parece se tornar moda não fazer que é mostrar com sua vida a indissolubilidade do sacramento do matrimônio que receberam, mas também a santidade do vínculo conjugal. Não é tarefa fácil, mas também ninguém prometeu hora alguma que seria fácil. O que temos que fazer é o que temos que fazer. Precisamos nos conformar com isso e não achar que só temos que fazer o que é prazeroso ou o que estamos com vontade. A vida não é isso.

Os filhos precisam dessa visão de eternidade e de sacralidade do matrimônio, mas não só eles, todos aqueles que estão em torno do casal precisam ver naqueles dois, católicos, essa sacralidade vivida dentro do matrimônio. É função de nós leigos transmitirmos isso a toda a sociedade que nos circunda.

Outro ponto essencial de apostolado do leigo na família é a criação dos filhos e aqui vamos tocar em várias situações sensíveis para muitos. O leigo católico tem por obrigação educar de forma cristã seus filhos e não terceirizar a educação deles. Hoje a confusão entre escola, que deve transmitir conhecimento, e pais que são educadores é enorme. Professores são professores e transmitem conhecimento, pais são pais e devem educar, ou seja, transmitir valores e senso social conforme pretendem que seus filhos o tenham. Infelizmente o que vemos hoje são pais que sequer sabem o que seus filhos estão vendo, ouvindo, aprendendo e vivenciado. Não conhecem os filhos e não sem importam. Terceirizam a educação, e acham que já fazem o suficiente pagando uma escola cara ou não, mas colocando os filhos em alguma escola que sequer sabem o que será falado e simplesmente os deixam a mercê de que a natureza tome conta do resto. A natureza não vai tomar conta do resto, porque se faltam os pais alguém suprirá essa falta. Na maioria absoluta das vezes não serão boas pessoas a suprirem. Nisso eu não excluo em momento algum os professores. Enfim, a função é dos pais, o apostolado é seu, é sua função de pai e mãe, bem como é sua função de leigo educar seu filho. É você que responderá perante Deus sobre a vida que ele lhe confiou e não o professor ou outra pessoa qualquer que você terceirizou a educação do seu filho.

O Decreto ainda continua no mesmo número 11:

Cooperem, pois, eles e os outros cristãos, com os homens de boa vontade para que estes direitos sejam integralmente assegurados na legislação civil.

É nossa função cooperar com outros para que essa dignidade familiar e direito natural dos pais de educarem seus filhos seja garantido, justamente porque é função do leigo que a sociedade civil em torno dele se santifique e que garanta que os valores cristãos sejam respeitados. Não é função de nenhum padre ou bispo de forma ordinária, é função do leigo.

As perguntas que ficam são: estou fazendo a minha parte? Luto para que os direitos sejam integralmente assegurados na legislação civil? Ou estou simplesmente sentado esperando que outros façam por mim? Ou estou simplesmente sentado colocando a culpa em outros que não fazem o que deveria ser eu a fazer?

O leigo tem a responsabilidade de entrar e santificar a sociedade civil justamente porque a sociedade civil tende a odiar, a palavra é essa mesma, odiar o que está mais intimamente ligado a religião. Portanto, a gravata entra onde a batina e o clergyman não entram. Na maioria dos ambientes é muito mais fácil que eu ou você sejamos ouvidos do que um padre ou mesmo um bispo. É isso que o documento Apostolicam Actuositatem, que foi redigido lá na década de sessenta, quase sessenta anos atrás, quer deixar claro e mostrar que é você, leigo, que precisa tomar a frente disso. A Igreja como instituição simplesmente não consegue, então é você que faz parte do Corpo da Igreja de forma mística é que precisa fazer isso. 

segunda-feira, 19 de julho de 2021

Apostolicam Actuositatem e o apostolado leigo nas famílias (parte 02)

Continuando com nossa sequência sobre o Decreto Apostolicam Actuositatem do Concílio Vaticano II, temos o seguinte.

O que na Igreja podemos chamar de apostolado conjugal, que nada mais é do que exercer essa vocação de pai, mãe, filho e irmão dentro de uma família, é algo de uma importância tão singular que não só a Igreja reconhece como a própria sociedade civil também.

Apesar de tantas tentativas de destruir a família que temos visto diariamente em várias frentes, é inegável que ela, a família, é o que sustenta qualquer sociedade de pé e equilibrada. Inclusive, é por isso que é tanto atacada, não percamos isso de vista. Infelizmente há grupos que entendem que a sociedade precisa primeiro implodir, ou seja, ser totalmente destruída, pra que depois eles a possam reconstruir como acharem que deve. Isso não vai acontecer, mas precisa do nosso empenho diário. Isso também não é mera teoria da conspiração, tem sido avisado a a anos por essas mesmas pessoas que tem esses planos, mas nós sempre achamos que o problema é menor do que realmente é e que isso nunca chegará até nós. Pois bem, chegou e está tomando conta.

A sociedade civil, e mesmo o Estado, entende que a família é algo tão importante que sem ela a sociedade se corrompe e acaba. Independente de o Estado reconhecer ou não a religião, independente de a sociedade civil ser católica, muçulmana, budista, judia ou atéia, a instituição familiar sempre foi entendida como aquilo que mantém a sociedade de pé e equilibrada e isso acontece desde as sociedades primitivas. Não há qualquer tipo de discussão sobre esse assunto que não seja concordando com esse ponto. 

Um grande apostolado começa com o primeiro passo e o primeiro passo não costuma ser um passo com tanto glamour ou cheio de adereços. O primeiro passo costuma ser simples, sincero e com grande expectativa de resultados. O primeiro passo para um bom apostolado dentro da família é fazer o simples, ou seja, o mais ordinário que um pai, uma mãe ou um filho podem fazer que é serem cooperadores da graça e testemunhas da fé um perante o outro. Não há como partir de outro ponto. É preciso que os filhos vejam e sintam essa cooperação dos pais para a graça para que possam ter ciência do que é e como é, para depois também serem esses cooperadores. 

Trabalhamos com o simples. Pais que exigem a presença dos filhos na catequese e nunca aparecem na Igreja não podem cooperar com nada, muito menos testemunhar a fé para os filhos. Filhos que não se esforçam para ver nos pais aqueles que querem sua santidade e apenas busca sugá-los de forma egoísta e autorreferente não tem como cooperar com nada nem ser testemunhas de nada que seja bom. O trabalho dentro da família começa com o mínimo, ou seja, respeito, bom senso, intimidade na graça para que possam encontrar a sua vocação e segui-la.


Apostolicam Actuositatem e o apostolado leigo nas famílias (parte 01).

Apenas para fazer uma pequena referência ao Decreto Apostolicam Actuositatem do Concílio Vaticano II, é bom que algumas coisas sejam comentadas, já que o tema do leigo sempre surge na Igreja, mas muitas vezes nunca se consegue chegar ao destinatário ou se fazer entendido quando é preciso colocar tudo em prática.

O Capítulo III do dito documento fala sobre os meios de atuação do leigo no mundo. Um desses meios é a família. Precisamos entender em que âmbito está a família então.

O governo da sociedade não é função de clérigos. Vamos começar já com esse impacto que parece óbvio, mas que na prática acaba não funcionando na cabeça de muitos. O governo da sociedade é função de leigos. Nós não deixamos de ser católicos quando entramos nesse meio e não governamos a sociedade só quando temos cargos eletivos como vereadores, prefeitos, governadores, deputados... Não é preciso ter cargo eletivo, ser “político” para ter função de governo da sociedade. Todos os que interferem de uma forma ou de outra na sociedade fazem o governo dela.

Entendendo isso, todos os que trabalham, atuam e se manifestam na sociedade auxiliam no governo dessa mesma sociedade de alguma forma. A questão aqui está em como devemos atuar. Nós vamos esquecer nossos valores religiosos quando atuamos ou vamos inserir isso na sociedade? É justamente isso que a Igreja pede a todos nós que somos leigos. Precisamos atuar na sociedade sem esquecer que somos católicos. Mais que isso, precisamos atuar na sociedade sem esquecer que cristianizar e santificar a sociedade é nossa função principal, ordinária.

É nesse ponto que o documento Apostolicam Actuositatem, 11 sugere a nossa interferência no que pareceu uma certa ordem de importância: primeiro as necessidades familiares de habitação e educação dos filhos. Depois as condições de trabalho seguros sociais e impostos.

Quando fala de necessidades de habitação e educação dos filhos, a Igreja espera tanto que o Estado interfira nisso apenas de forma subsidiária, ou seja, quando a família não conseguir resolver, o Estado entra para solucionar e já sai imediatamente do âmbito familiar após resolvida a situação, quanto que o Estado faça sua parte bem feita e sem interferências ideológicas quando for preciso fazer. Infelizmente não é isso que temos visto. Não temos visto nenhum tipo de subsidiariedade. O que temos visto é o Estado invadindo o âmbito familiar como um todo e nisso não estou falando só sobre o Brasil, é um fenômeno mundial.

As questões de trabalho, seguro social e impostos, da mesma forma, existem para que a sociedade seja servida deles e não que o Estado se sirva da sociedade e alguns privilegiados usem desse serviço. A medida que trabalhamos e vivemos para sustentar um estado que vai se tornando um peso e não uma solução subsidiária para os problemas mais gerais, nesse ponto o Estado está com sua função absolutamente deturpada.

Falamos bastante nesse ponto sobre subsidiariedade. Vamos explicar um pouco o que significa isso. Explicar rapidamente. A subsidiariedade é um princípio da Igreja que é muito usado pela Doutrina Social da Igreja e pelo Direito Canônico, entre outras áreas também. Quer dizer que a instância superior, mais forte ou hierarquicamente mais alta não deve interferir na instância inferior se essa instância inferior conseguir resolver o problema. Em outras palavras, significa que é melhor deixar para os menores grupos o máximo de resoluções possíveis. No âmbito da Igreja, a diocese não precisa entrar em problemas que a paróquia consegue resolver e a paróquia não precisa entrar em problemas que a família consegue resolver. Funciona da mesma forma para o Estado. O Estado não entrar no que a família consegue resolver sozinha.


quarta-feira, 5 de agosto de 2020

Resumo do DECRETO ORIENTALIUM ECCLESIARUM

Resumo do

DECRETO ORIENTALIUM ECCLESIARUM

SOBRE AS IGREJAS ORIENTAIS CATÓLICAS

 

PROÊMIO

Estima das Igreja Orientais.

A Igreja Católica tem em alta conta as instituições, os ritos litúrgicos, as tradições e a disciplina das Igrejas Orientais e, por esse motivo, entendendo que a Igreja Universal é indivisa, esse patrimônio deve ser conservado. Assim sendo, o Concílio decidiu estabelecer alguns pontos na relação dessas Igrejas Orientais com a Igreja Universal e deixando o restante para os Sínodos locais.

 

AS IGREJAS PATICULARES OU RITOS.

Diversidade de ritos na unidade da Igreja.

A Igreja Católica em sua unidade, une organicamente no Espírito Santo todas as Igrejas rituais. Unidos na hierarquia todas as Igrejas particulares e ritos em uma admirável comunhão que manifesta unidade e não a prejudica de forma alguma a Igreja Universal. Permanecem salvas e íntegras cada Igreja particular e rito mesmo que se adapte a forma de vida aos tempos e lugares.

 

Submissão ao Romano Pontífice.

As Igrejas particulares do Oriente e Ocidente se diferem na liturgia, disciplina e patrimônio espiritual, contudo são iguais no governo pastoral em torno do Pontífice Romano. Gozam de igual dignidade todos os ritos e nenhuma precede outra seja em direitos, seja em deveres.

 

Proteção e desenvolvimento.

Onde for necessário se constituam paróquias de hierarquia própria e os hierarcas procurem favorecer a unidade de ação mediante encontros periódicos com o fim de proteger mais eficazmente a disciplina do clero e promover o bem da religião.

Os clérigos vão ascendendo com boa instrução sobre os ritos e normas práticas nas matérias interrituais. Os leigos tenham uma instrução catequética sendo instruídos sobre ritos e normas. Fica salvo o direito de recorrer, em casos peculiares de pessoas, comunidades ou regiões à Sé Apostólica.

 

CONSERVAÇÃO DO PATRIMÔNIO ESPIRITUAL DAS IGREJAS ORIENTAIS.

A disciplina oriental, patrimônio da Igreja de Cristo.

O Sagrado Concílio honra o patrimônio eclesiástico das Igrejas Orientais e também o espiritual considerando que seja um patrimônio da Igreja Universal. Igrejas Orientais e Ocidental tem o direito e o dever de se regerem conforme suas próprias e peculiares disciplinas pois estão mais aptas a buscar o bem das almas.

 

Conservação e restauração das antigas tradições

Saibam os orientais que podem e devem observar seus ritos litúrgicos e disciplina e que não serão introduzidas modificações que não forem próprias e orgânicas. Se um dia alguns abandonaram seus ritos que regressem às suas tradições ancestrais. Aquele que por ofício tem contato com os Orientais que busque entender os ritos, disciplina, doutrina, história e índole. Recomenda-se que Ordens e Associações ocidentais em países orientais estabeleçam casas ou províncias no rito oriental

 

OS PATRIARCAS ORIENTAIS

Natureza e jurisdição

Patriarcado é antiquíssimo na Igreja. Isso faz com que o Patriarca tenha jurisdição sobre todos os bispos, inclusive metropolitas, salvo o primado do Papa dentro do seu rito. Qualquer hierarca fora do território patriarcal permanece agregado à sua hierarquia ritual.

 

Igualdade entre eles na dignidade

Os Patriarcas são todos iguais em dignidade patriarcal salvo precedência de honra estatuída entre eles.

 

Restabelecimento de seus direitos e privilégios.

Singulares honras devem ser atribuídas aos Patriarcas conforme antiquíssima tradição. Por isso o Concílio restaura os seus direito e privilégios como no tempo da união do Ocidente com o Oriente, embora adaptados às novas condições. Os Patriarcas com os seus sínodos são a instância suprema para os assuntos do Patriarcado podendo constituir novas eparquias e nomear bispos do seu rito, salvo o direito do Papa de intervir em cada caso.

 

Os arcebispos maiores

O mesmo direito dos Patriarcas é dado aos Arcebispos maiores em uma Igreja Particular ou Rito.

 

Ereção de novos patriarcados.

O Concílio Ecumênico e o Romano Pontífice têm a reserva de constituir novos patriarcados onde for necessário.

 

A DISCIPLINA DOS SACRAMENTOS

Conservação e restauração da disciplina oriental.

O Concílio deseja que seja restaurada a antiga disciplina sacramentária das Igrejas Orientais, da sua celebração e administração.

 

O ministro da Confirmação

Restaurada a disciplina quanto ao ministro da Confirmação os Presbíteros podem conferir o Crisma. Os presbíteros orientais podem administrar o crisma para os fiéis inclusive os latinos. Também os presbíteros latinos podem administrar o crisma para os orientais sem prejuízo.

 

A Sagrada Eucaristia

Obrigação de participar da missa nos dias de festa e domingos, mas também conforme as prescrições ou costumes na celebração do Ofício divino. O tempo útil para o preceito começa na tarde da vigília até o fim do domingo ou da festa.

 

O ministro da penitência

A faculdade de ouvir confissões para os que tem essa faculdade em determinado território é livre para ser exercida a fiéis de qualquer rito.

 

O diaconato e as ordens inferiores

Se deseja que o diaconato permanente seja restaurado onde caiu em desuso. Quanto ao subdiaconato e ordens menores cada Igreja particular tem autoridade legislativa.

 

Os matrimônios mistos

Em casamentos mistos, católicos orientais com acatólicos orientais batizados, a forma canônica é para a liceidade. Para a validade é suficiente a presença do ministro sagrado.

 

O CULTO DIVINO

Os dias festivos

Para o futuro apenas o Concílio Ecumênico e a Santa Sé poderão constituir, transferir ou suprimir dias de festa nas Igrejas Orientais. Nas Igrejas Particulares cabem também aos Sínodos patriarcais e arquiepiscopais resolver quanto aos dias de festa.

 

A data da Páscoa

Enquanto há divergência que os Patriarcas ou as supremas autoridades do lugar, por consenso unânime e ouvidos os interessados, convenham sobre a celebração da Páscoa.

 

O ciclo litúrgico

Os fiéis que estão fora do território do seu rito se insere na disciplina do lugar onde moram. As famílias com rito misto, convém que sigam um mesmo rito.

 

O ofício litúrgico

Clérigos e religiosos celebrem segundo os preceitos e tradições do seu rito e que participem os fiéis todos devotamente, quando possível, do Ofício Divino.

 

O uso das línguas vernáculas

O Patriarca com o Sínodo ou a suprema autoridade definem sobre a língua das cerimônias litúrgicas e informem a Santa Sé para aprovar as traduções vernáculas.

 

A CONVIVÊNCIA COM OS IRMÃOS DAS IGREJAS SEPARADAS

Importância das Igrejas Orientais no momento ecumênico

Às Igrejas Orientais compete a obrigação de favorecer a unidade de todos os cristãos pela Oração, exemplo, fidelidade religiosa com as tradições, conhecimento e colaboração com as instituições.

 

A incorporação dos irmãos separados

Aos Orientais separados só se exige a simples profissão de fé católica. Aos clérigos, por terem ordenação válida, tem faculdade de exercerem a própria ordem com normas da autoridade competente.

 

A “communicatio in sacris”

A communicatio in sacris que inclui adesão ao erro, escândalo ou indiferentismo é proibida. Pastoralmente se verifica que em várias situações esse perigo de adesão ao erro, escândalo e indiferentismo não acontecem. Por isso, em certas circunstâncias de tempos, lugares e pessoas é possível a communicatio in sacris para o bem das almas e se estabelece que:

a) Podem ser conferido aos Orientais separados os sacramentos da Penitência, Eucaristia e Unção dos Enfermos;

b) Também aos católicos é permitido pedir esses mesmos sacramentos quando houver verdadeira necessidade e utilidade espiritual

c) Com justa causa se permite a communicatio nas funções sagradas.

Essa communicatio mais suave é confiada aos hierarcas locais em conformidade com os hierarcas das Igrejas separadas.

 

CONCLUSÃO

Colaboração na consecução da unidade

Todos os cristãos, orientais e ocidentais, são exortados que se esforcem ao máximo para a unidade plena com orações fervorosas e frequentes.

segunda-feira, 10 de junho de 2019

O Matrimônio. O número 48 da Constituição Gaudium et Spes. Parte 1.


O número 48 da Constituição Gaudium et Spes, composta de três parágrafos, e que dá abertura ao título sobre o sacramento do matrimônio, tem um série de definições que podemos verificar:

“A íntima comunidade da vida e do amor conjugal, fundada pelo Criador e dotada de leis próprias, é instituída por meio da aliança matrimonial, ou seja pelo irrevogável consentimento pessoal.”

Trata-se de um conceito simples e direto de matrimônio que depois vem a ser desenvolvido com mais profundidade. Já de princípio o número dá total embasamento para o cânon 1055, §1 do CIC que conduz às finalidades do matrimônio, mas também deixa claro que se trata de direito natural, uma vez que fundada pelo Criador.

O casamento, portanto, não é algo que a Igreja Católica inventou, muito menos algo que possa ser propriedade da Igreja, o que denota, desde já que os ataques ao matrimônio são, na verdade, ataques à lei natural, e não à Igreja como muitos querem deixar transparecer.

Independente de qualquer alvo, o que temos é que povos que nunca tiveram contato co o cristianismo ou mesmo muito antes do cristianismo existir, já existia o casamento. O que a Igreja determina, para os seus, é a norma canônica, chamada “forma canônica” para que a celebração tenha validade, entretanto isso é assunto para outro texto.

Essa pequena frase que inaugura o texto do número 48 ainda denota que é preciso o consentimento pessoal para o matrimônio, isto é, sem o consentimento pessoal não há matrimônio. Esse consentimento precisa ser livre e consciente, sem liberdade não há consentimento válido, sem consciência do que se escolhe, também há invalidade. O grande problema nos dias atuais é, antes de tudo, saber onde se encontram os limites dessa consciência.

Seguindo no texto temos:

“Deste modo, por meio do ato humano com o qual os cônjuges mutuamente se dão e recebem um ao outro, nasce uma instituição também à face da sociedade, confirmada pela lei divina.”

Além da insistência do excerto em, frase após frase, manifestar que se trata de lei divina, portanto natural, temos que esse ato é humano, o que nos parece óbvio, mas em dias atuais o óbvio é justamente o que se tem que falar. Animais não tem capacidade de assumir compromisso matrimonial, não podem consentir ou deixar de consentir.

Fala também de se dar e receber um ao outro. Trata-se aqui, mais do que sentimentalismo, ato concreto de agir, se entregando pelo bem do matrimônio e recebendo pelo bem do matrimônio, é o bonun coniugum (bem dos cônjuges).

Por fim, na segunda parte dessa segunda frase, temos que desse ato humano nasce uma instituição que tem repercussão na sociedade e quem advém da lei natural. Essa repercussão da lei natural (lei divina) é justamente o que tanto vem sendo atacado e a total falta de bom senso entre o ato de quem ataca e a realidade é possível ser verificada justamente por ser uma lei inscrita no coração do homem (lei natural). Essa lei não pode ser simplesmente revogada como querem alguns.

Por fim, analisando apenas a terceira frase do primeiro parágrafo, de três, desse número 48, temos o seguinte:

“Em vista do bem tanto dos esposos e da prole como da sociedade, este sagrado vínculo não está ao arbítrio da vontade humana.”

Esse é o ponto crucial para a sociedade atual: não está ao arbítrio da vontade humana. A indissolubilidade do casamento é algo que não está ao mero dispor das pessoas e pode ser manejado sem graves consequências e repercussões.

Se a própria indissolubilidade e não só o direito ao matrimônio está fundada em um direito natural, suas repercussões posteriores são no campo da moral ou legais de religião.

 Tanto assim que a ex-URSS, após abrir-se plenamente ao divórcio após a revolução de 1917, viu-se em situação social degradante e em 1944 estabeleceu nova lei sobre famílias que praticamente tornou o matrimônio indissolúvel. Tudo isso após verificar empiricamente que os divórcios causaram: dificuldades na educação permanente dos filhos, dificuldades com a natalidade, instabilidade no lar e consequência falta de paz social, dificuldade de produção por desagrupamento familiar causado pelo divórcio, como nos confirma Dom Rafael Llano Cifuentes em seu  livro “Novo Direito Matrimonial Canônico”, p.121.



Significa que até um Sistema altamente materialista, que sempre fez questão de combater todos os preceitos religiosos precisou se curvar a realidade desses fatos.

Em casos extraordinários graves e dolorosos a dissolução do vínculo parece ser a coisa mais humana a se fazer. Entretanto, é preciso tomar cuidado com esse tipo de pensamento.

Como o conceito de “casos extraordinários graves e dolorosos” pode ser algo absurdamente subjetivo e amplo, qualquer situação pode caber nesse conceito e tudo poderia ser motivo para divórcio. É precisamente o que acontece nos dias atuais. Por esse motivo poderia ser interessante que houvessem critérios objetivos que justificassem um pedido de divórcio, e não a simples vontade como hoje se dá. Contudo, mesmo assim, percebe-se que, quando se tentou agir dessa forma, os interessados no divórcio começaram a burlar o Sistema causando frivolamente a situação prevista em lei de forma artificial para justificar o divórcio.