sexta-feira, 3 de maio de 2024

A reforma do Código Civil. Breves pontuações.

Para os que ainda não sabem, o nosso Código Civil, que só tem pouco mais de 20 anos, está sendo estudado por uma comissão indicada pelo Senado cuja tarefa será apresentar um anteprojeto para "modernizar" o código. 

Antes de falar um pouco sobre algumas das muitas questões que incomodam nesse estudo e no que já foi apresentado desse anteprojeto, só queria chamar a atenção para um detalhe: esse código tem pouco mais de 20 anos, ele já precisa ser reformado? A pergunta é pertinente porque será que a sociedade mudou tanto em 20 anos a ponto de ter que fazer uma reforma, ou seja, muitas mudanças, no código civil? Lembre-se que o Código Civil anterior vigorou de 1916 até início de 2003. Tivemos mudanças nele? Sim. Tivemos mudanças de conceitos? Sim. Tivemos reforma? Me parece que não foi preciso, não é. Quando foi preciso fizeram um novo código.

Mas enfim, o argumento é que a sociedade atualmente é muito mais acelerada e muda constantemente. O ritmo alucinante de mudanças sociais levam a ter que fazer essas reformas. Bom, o ritmo alucinante que o mundo vive atualmente é inegável, a necessidade de mudanças radicais de tempos em tempos pra correr atrás desses mudanças já é outra história. 

Vamos falar um pouco sobre uma ou outra proposta:

status de animais. A ideia é mudar o status civil dos animais mudando até a sua denominação de animais para seres vivos. Uma obviedade que não precisava constar no código, afinal todos estão vendo ou percebendo que são seres vivos. Até onde eu sei ninguém nunca negou que um animal é um ser vivo. Contudo, a proposta vai mais a fundo, já que a mudança de nome serve para mudar o status legal de uma animal, ou ser vivo, para que possa ser passível de proteção jurídica própria. A minha pergunta é: qualquer ser vivo? Uma árvore, uma barata, o mosquito da dengue... todos são seres vivos. Quem vai definir quais seres vivos são passíveis de proteção jurídica própria? O Judiciário por jurisprudência? Lei especial? Qual será o critério? Um bichinho fofinho será o critério? Ou teremos uma proteção geral e poderemos relegar as empresas de dedetização a criminosos? Não vou nem falar sobre o impacto disso no setor pecuário.

Exageros a parte, meus comentários acima com analogias que beiram o riso só foram feitos em tal grau de exagero porque era necessário mostrar o nível de absurdo disso tudo. Animais são animais. Obviamente que é necessário uma certa proteção no sentido de evitar maus tratos, mas daí a mudar seu status legal é uma outra história. Os exageros acima acabam sendo plausíveis devido ao absurdo disso tudo.

2º Direito de família. Pra começar houve divergência entre os membros da comissão sobre ser direito de família ou das famílias. Isso aí já mostra uma desconexão com a realidade. Querem trazer para a lei civil maior da nossa frágil federação questões menores de grupos pequenos e barulhentos. O brasileiro médio, que é a maioria absoluta da população, sequer tem noção do que são grupos familiares "indefinidos". Não se trata de tais grupos não constarem na lei por não poderem ser protegidos por serem minoria. A questão é que é uma questão menor que não pode equipara o pensamento geral da população em sua maioria, com a ideia de família (ou de não família) que alguns tem devido a ideologias diversas.

Ainda dentro desse tema, não vou nem falar da parte da gravidez ficar em segredo (o que furtivamente não constando na lei serve para abortar sem serem incomodados), temos a questão da família conjugal e não conjugal. A ideia, que parece boa mas que vai degringolar em vários problemas, é que família não conjugal sejam por exemplo, irmãos que passam a morar juntos despois da viuvez de cada um deles.

Podemos dentro desse tema falar de paternidade socioafetiva, o que é bom, mas que deve ter todo cuidado para que soluções não se tornem problemas ainda maiores e mudanças no casamento civil.

Enfim, a verdade é que o que foi apresentado no mês de março de 2024 foi alvo de críticas até de alguns membros da comissão que tem 38 integrantes. Vamos ver no que isso dará uma vez que temos mais reuniões antes da apresentação do projeto final.

quinta-feira, 2 de maio de 2024

O grande tema do momento: Musk x Xandão.

O grande tema da imprensa e das redes sociais já há vários dias é a liberdade de expressão, mas de forma mais específica, já que não conseguimos no Brasil debater temas e preferimos debater pessoas, ou seja, fofocar, a grande fofoca do momento é Alexandre de Morais x Elon Musk.

Não vou me dar o trabalho de fazer histórico do que já aconteceu até aqui. Se você entrou nesse texto é porque tem acompanhado o babad.., opa, o assunto do momento.

Não é surpresa pra ninguém que tenha algum bom senso que boa parte dos brasileiros, especialmente aqueles que estão nos extremos ideológicos, seja à direita seja à esquerda, ou seja, aqueles que estão nos extremos da ferradura e que parecem usar ferradura também, põe as suas ideologias acima de tudo e de todos.

Pronto, agora que todo mundo já está devidamente ofendido, vamos ao que interessa.

Há uma posição premente entre alguns bons juristas de plantão que é a de que “decisão judicial deve ser cumprida e se quiser que se recorra”. “Tá certo”. O problema é quando não se tem a quem recorrer, lembre-se que estamos aqui falando do Augusto Colendo Excelsior (acho que já está bom) STF. Não tem outra instância acima para recorrer. Estamos falando de ações inauguradas de ofício, ou seja, por eles mesmos sem ninguém ter provocado (aos que não sabem isso não pode acontecer). Portanto, trata-se de uma série de ações ilegais que geram decisões ilegais em confronto com a legislação constitucional, infraconstitucional e o coitado do bom senso também. Não há muito o que fazer nos casos dessas ações a não ser espernear em redes sociais, sair do país se auto-exilando ou desobedecer (isso é só pra pode ou consegue).

Por outro lado, vamos pensar com a cabeça e não com o fígado. É claro e óbvio que um bilionário não está interessado no bem-estar do povo brasileiro e tem interesses por trás disso, contudo isso não é crime também (ou já virou?). Enfim, ele não é o super-herói que alguns pregam e suas intenções não são puras e imaculadas, o que, a meu ver, não muda em nada o fato de que as coisas que está dizendo são verossímeis.

Em tempo, gosto muito de milionários, mas detesto bilionários. Esses últimos tem sempre uma ideia de dominação do mundo que não dá pra aguentar.

Ordens judiciais não podem ser ilegais e ferir frontalmente a constituição e os direitos mais básicos e naturais. A liberdade de expressão é um direito natural e nem precisava constar na constituição, mas consta. Então decisões que ferem a liberdade de expressão ferem o direito natural e a constituição. Ordens judiciais ilegais devem ser cumpridas? Eis a questão. Se sair uma ordem judicial mandando assassinar um certo grupo de pessoais, o que há de se fazer? Cumprir enquanto não se recorre? Lembrando que já temos exemplos de isso ter acontecido. O exagero foi proposital pra verem que as coisas podem evoluir e já evoluíram muito nos últimos anos. Há trinta anos o exemplo de uma ordem judicial mandando matar seria tão absurda quanto várias que temos visto atualmente.

Outro prisma a ser visto é que não se pode ter a liberdade de expressão como bem supremo e acima de todas as coisas. Claro que tudo tem limite e quem atropela esse limite deve pagar por isso. Só que tem meios de se pagar por isso, assim como precisam ter meios para averiguar se houve excesso. Esses meios precisam garantir o direito de ampla defesa e contraditório. Será que estou falando alguma coisa que não se explica no primeiro semestre de algum curso de direito?

Claro que é inaceitável o descumprimento de decisão judicial por simplesmente discordar, assim como é inadmissível inquéritos atropelando a polícia, o Ministério Público, advogados e mais um sem número de procedimentos, onde um ministro do STF, é vítima, investigador, promotor e juiz. Nunca na história desse planeta teve algo assim. Falam tanto da inquisição, mas foi ela que nos ensinou que não se pode agir dessa forma. Estão sendo mais arcaicos que a inquisição então. Lembrando que a inquisição foi um período que floresceu o que hoje temos como direitos processuais.

A censura que tanto se fala está em um nível muito mais alto. Estamos em um nível de auto-censura, ou seja, estamos pensando dez vezes antes de falar ou escrever alguma coisa sobre alguma corte do judiciário ou mesmo sobre pessoas que são funcionárias públicas e que não podem ser criticadas. Não pode nem comentar o penteado (ou falta de) de algum deles. Não podemos falar o que se pensa, não se pode falar nomes, caso contrário o canal do youtube cai, o instagram é bloqueado ou perdido, o site é investigado e entramos para uma lista de um processo que mais parece a ficção de Kafka (que não leu “O processo” de Franz Kafka, por favor o faça)