sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Ideais sepultados, mas nunca praticados. O que há de errado com o mundo. Parte 5


É no mínimo interessante pensar o quão difícil pode ser praticar algo que só se tem uma vaga ideia do que seja. Com o catolicismo é assim. A maioria das pessoas apenas vagueia pelo mais superficial que se possa encontrar sobre o assunto e já se consideram os grandes mestres e doutores no assunto. Seria como requerer CRM após ler o livrinho de biologia do 5º ano, ou como se vangloriar de ser um entendedor de Direito porque ler o artigo 5º da Constituição Brasileira, por mais bizarro que fazer isso possa parecer.

O ideal que se coloca em prática é tudo o que o ideólogo não quer. Enquanto o ideal está represo na mente de quem quer que seja, ele é apenas um vírus mental, uma vontade que pode mover montanhas, mas só pode. A partir do momento que ele é colocado em prática, tudo pode desmoronar ou desmoronar outros ideais já existentes que nunca chegaram a essa prática. Ideal é feito pra continuar sendo ideal, caso contrário deixa de ser ideal, já que as dificuldades da sua prática vão desfortunar o praticante do ideal. Ora, se isso acontece, nada mais lógico que imaginar que provavelmente não era o ideal que deveria ser colocado em xeque, mas o praticante do ideal. Provavelmente ele é que não foi competente pra colocar tudo em prática da melhor forma a fazer funcionar. Quem dera tudo isso fosse tão simples!

Um ideal quando colocado em prática provoca sempre fúria e paixão. Fúria por parte dos seus adversários e paixão por parte dos defensores.

Nada disso interessa até o momento em que os apaixonados começam a abandonar a ideia por ser de impossível prática. Ora, mais uma vez nos parece ter ficado claro que o problema está em quem não conseguiu praticar e não no ideal.

No tópico 6 da parte I do Livro de Chesterton, O que há de errado com o mundo, ele coloca justamente que a prática correta do ideal costuma levar os adversários e apaixonados pelo ideal a apedrejar essa prática.

Ele cita que o mundo sempre foi absolutamente apaixonado pela pureza e demonstrou isso desde a mais tenra filosofia grega e romana com a adoração de deusas como Atena, Ártemis e Vesta, mas assim que as cristãs resolveram colocar em prática essa pureza virginal, começaram a ser jogadas aos leões e ardiam no fogo romano. Assim acontece até hoje. Que nenhuma menina ou adulta defenda a virgindade em público, caso contrário o martírio moral e da ridicularização virá. Quanto aos homens, ainda mais com relação a esse tema, a coisa piora.

O mundo considera a pobreza um ideal maravilhoso e que apenas grandes pessoas podem alcançar, desde que não seja eu ou qualquer um perto de mim. Caso um amigo resolva deixar tudo o que tem: empresa, emprego, namorada, casa e conta bancária, para viver em um mosteiro ou mesmo que seja menos radical e vá para um seminário, imediatamente é taxado de louco. Cinderela sempre será um belo conto de fadas, desde que ela continue pobre, afinal a história acaba quando ele sai da pobreza. Queremos padres em todas as ocasiões desde o batizado até o funeral e missa de sétimo dia, desde que o meu filho não tenha que ir para um seminário. Ora, não queremos o melhor para os nossos? A pobreza e pureza virginal não são belos ideais? Porque não podemos coloca-los em prática?


O que Chesterton pretende é mostrar que os ideais sequer foram explorados e só não o foram por absoluta incompetência de nós mesmos. Porque a gana de criar novos ideais se sequer conseguimos praticar os antigos? As pessoas não se cansaram do cristianismo e por isso vemos o que vemos hoje, na verdade nós nunca colocamos o cristianismo em prática suficientemente para nos cansar dele. Os que o fizeram, normalmente não reclamaram, mesmo quando ardiam nas brasas do martírio. Até pediam por isso. Hoje frequentam os altares.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

O perigo de um político pobre. O que há de errado com o mundo. Parte 4.


A pobreza é perigosa para um político. Essa ideia parece absurda, mas é outra que aparece com o fundamento muito bem colocado no tópico 5 da primeira parte do livro “O que há de errado com o mundo” de Chesterton.

A facilidade com que ele coloca essa ideia em poucas linhas é impressionante como toda a sua obra.

O estadista pobre é perigoso pelo simples fato de que, sem o cristianismo, isso para nós ocidentais, a pobreza não significa nada. Explico. Foi o cristianismo divulgado pela Igreja dos primeiros séculos que criou o pensamento de caridade. Não a caridade simples de doar coisas, mas essa também. Antes não havia muito sentido em fazer caridade. Era coisa de gente desequilibrada mentalmente. Jesus não foi considerado perigoso pelos pensadores da época e louco pelos mais simples a toa. Essa ideia permeia o cristianismo desde sempre: felizes os pobres, porque deles é o Reino dos Céus (Mt. 5, 3).

Sem o cristianismo não há motivo para ser pobre já que não há reino nenhum a ser atingido. Sem o cristianismo o ser pobre é puro idealismo que leva a pura demagogia de atingir um bem futuro com essa pobreza, já que só essa vida interessa e depois nada existe. Assim, a pobreza é só um caminho para a futura riqueza, talvez não de pertences, mas de poder. Poder que, irremediavelmente leva à riqueza em algum momento. Esse é o ser humano.

O político pobre quer, antes de tudo, resolver esse problema que assim ele entende. Pra uma pessoa que não é impulsionada por ideais cristãos, eu disse impulsionada e não que divulga ou é cristão, não há motivo algum para continuar sendo pobre até o fim da vida. A pobreza será apenas as migalhas de pão que levarão a uma futura e rica casa de doces dos mais variados. O que há lá dentro é outra história.

O político pobre, portanto, busca a riqueza. Sua pobreza é um problema em sua cabeça. O político rico já nasce rico e não precisa chegar à riqueza, já que já está lá. Obviamente que esse argumento não resolve outros tipos de riqueza como o poder, mas que diminui muito a necessidade de desvios de riqueza material, sem dúvida que diminui. No argumento de Chesterton: “ele nasce com uma colher de prata na boca a fim de, mais tarde, não aparecer com uma no bolso”, “o estadista é subornado para não ser subornado”. Não é preciso explicar isso. A metáfora é sempre autoexplicativa.

Claro que nascer com a colher de prata na boca não significa que não se verá em um certo momento histórico com uma faca nos dentes, isso segundo Chesterton. Por esse motivo é que mencionamos que resolve o problema do desvio material, mas nunca a gana de poder que é inerente e só pode ser resolvido com um pensamento direto e fácil de ser entendido. Um pensamento que pode permear a vida de qualquer pessoa, desde o mais pobre ao mais rico e poderoso. Como chega a esse pensamento é que causa tanta discórdia.

Enquanto o socialismo promete isso querendo mostrar que todos somos iguais e que podemos fazer um mundo sempre melhor aqui, com todas as benesses e prazeres, todos desfrutando de tudo, de todos e de todas as possibilidades, o cristianismo mostra que o ser humano não quer ser igual porque é criado diferente e, consequentemente, cada um tem suas necessidades próprias que diferem uns dos outros. A ideia de igualdade fica maculada desde seu nascedouro. É impossível fazer com que todos sejamos iguais se não somos iguais em nada. Precisaríamos mudar a natureza humana. O socialismo tenta fazer isso através de uma revolução cultural que pode dar certo no início (nosso momento histórico), mas não dura muito tempo. Dura tão somente até que alguém entenda que está sendo cerceado do seu direito no lugar de tê-lo por completo como foi prometido.

Por outro lado, o cristianismo entende essa diferença e mostra a todos que a verdadeira caridade é o amor pelo qual as pessoas devem ver as necessidades do próximo e que esse amor deve ser “alterconstrutivo”, ou seja, cada um deve construir um mundo melhor através da construção de um mundo melhor para a pessoa que está ao seu lado. Para isso deve agir corretamente, mas deve, antes de tudo, pensar no outro antes de pensar em si mesmo. Isso leva ao “orgulho” da pobreza, uma vez que, sendo pobre, está tornando o outro mais feliz porque está satisfazendo-o ao abrir mão de algo em prol desse outro. Esse outro, por sua vez, se satisfaz pelo simples fato de que seu próximo está trabalhando no fato de querer ser melhor, mesmo sem conseguir êxito completo. Assim, cada um está em um estágio e todos caminhando para o mesmo fim. Uns mais perto do objetivo outros mais distantes, uns andam mais rápido, outros mais lentamente, mas todos olhando para o mesmo objetivo.


O simples pensar dessa forma, mesmo que a prática seja muito mais difícil e controversa que isso, torna o político um servidor do outro, e não um servidor dos seus próprios interesses. 

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Uma derrota sem refutação. O que há de errado com o mundo. Parte 3.

Os idealistas modernos tem em mente que se algo foi derrotado, foi refutado. Esse é um dos centros do quinto tópico, da primeira parte do livro “O que há de errado com o mundo”. O Autor Chesterton menciona essa linha de pensamento em vários momentos durante o livro e o demonstra perante várias perspectivas, entretanto ele o coloca como algo que deve ser pensado de forma totalmente contrária, ou seja, justamente porque foi derrotado é porque muito provavelmente não foi refutado.

O que Chesterton coloca é que se algo foi derrotado, justamente é porque não foi ou não deve ter sido necessariamente refutado. A história é contada pelos vencedores, os que sobreviveram. Se é assim não há como, nem porque os vencedores falarem bem ou divulgarem a ideologia e pensamentos dos derrotados. Eles simplesmente lançam uma pá de cal sobre o assunto ou tentam demonstrar que as mais profundas e belas filosofias são de perversidade monstruosa e desumana a ponto de não poderem sequer serem analisadas.

Nossa realidade é exatamente essa. Apesar de o livro ter sido escrito na primeira década do século XX, nada mais atual do que esse pensamento e nada será cada vez mais atual com o decorrer do tempo se continuarmos no toada que estamos.

Boa parte das ideias religiosas, tomando essa parte como exemplo, sequer pretendem ser discutidas e são colocadas como erradas (refutadas) pelo simples fato de existirem. São retrógradas por que são antigas. São ultrapassadas porque vem de instituições milenares. São refutadas porque as tem como derrotadas. Nada mais insano! O argumento se torna ad hominem, ou seja, se você pensa assim, não importam os argumentos que você tenha: você está errado por existir. Não é necessário sequer ouvir, debater ou analisar argumentos: você está errado por ter nascido com esse pensamento no século errado.

Que levante a mão armada com pedras aquele que tem um pensamento religioso, político conservador, antirrevolução francesa ou qualquer outro pensamento tido por ultrapassado e que não tenha se sentido uma voz no deserto, mesmo que fale para uma multidão. A multidão é surda aos seus argumentos e muito barulhenta frente as atitudes, quando devia simplesmente ter o respeito de parar e ouvir para entender, mesmo que não concorde.

Independente da conduta atual, sua fundamentação que fez evoluir para esse momento histórico intolerante por natureza, é que os ideais antigos não foram, na verdade, refutados e por isso derrotados, mas na verdade não foram realmente vividos. Foram apenas ideais lançados em traços de papeis que nunca foram colocados em prática. O catolicismo é um bom exemplo disso, tendo ele por base já que é nosso tema central.

O catolicismo nunca foi vivido plenamente. Os católicos, hoje mais que na maioria dos momentos históricos, é formado por uma multidão que diz acreditar em um boneco de pano. Sequer sabem o que falam ou professam. Dizem pertencer a uma religião que sequer entendem do que se trata. Apenas se dizem. Nunca foram.

O Papa Bento XVI, em certa oportunidade de seu pontificado mencionou que sempre fomos um pequeno grupo de pessoas. A verdade é que por muitos séculos foi moda ser católico. Muitos se diziam católicos pelo mesmo motivo que hoje muitos comem sanduíche, ou seja, pelo simples motivo de que é mais fácil e está mais à mão no momento. Nada mais que modismo e praticidade. Nunca viveram plenamente o catolicismo. Nunca entenderam. Nunca souberam o que era viver.

Nos dias atuais somos exatamente assim. Por mais que centenas de milhares encham as ruas no Círio de Nazaré, nem um por cento vive e ou quer viver realmente o catolicismo. Fazem por simples tradição, farra ou superstição. Nenhuma das três opções são realmente católicas.

Isso tudo só aconteceu não porque o catolicismo foi analisado, entendido e julgado insuficiente ou errado, a questão é que ele foi superficialmente olhado, em nada analisado e julgado deficitário e antecipadamente muito difícil de ser vivido, portanto ultrapassado. Foi puro comodismo mesmo.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

O Mundo não precisa de práticos. O que há de errado com o o mundo. Parte 2.

Na parte I, segundo tópico do livro "O que há de errado com o mundo", Chesterton coloca uma interessante questão: o mundo está muito prático e o prático não resolve problemas.

A ideia é simples: se o mundo não anda bem, significa que algo está errado. Se algo está errado, não podemos usa de praticidade para resolver o erro, mas sim de uma teoria, ou seja, não precisamos de um prático, precisamos de um teórico.

O prático faz as coisas funcionarem de forma considerada eficiente dentro do conceito de sucesso que se quer alcançar. Mas como o prático pode fazer a coisa funcionar se ela não está dando certo? Se contém um erro? Algo precisa ser mudado, melhorado ou consertado. Para se chegar a qualquer uma das três coisas é preciso parar e pensar em como fazer. Isso um prático não faz, apenas um teórico.

O grande problema é que hoje praticamente não temos teóricos e teoricamente só temos práticos. Inobstante o trocadilho quase infame, não se explica mais a ninguém como pensar. Escolas, universidades e família estão tão preocupados com resultados em um período curto de tempo que não sobra tempo para pensar, para teorizar.

Uma grande questão é que hoje tudo é rápido e... prático. Não é preciso saber como plantar um alface já que pra maioria de nossas crianças e até adultos . alface nasce dentro da geladeira, quando muito nasce na seção de hortifruti do supermercado. Quantos adultos você conhece que ficam na dúvida quando perguntados se melancia dá em árvore ou no chão? Essas coisas são simples questões, mas não são nada práticas. É muito mais fácil e... prático, comprar tudo pronto.

Saindo desse microuniverso e indo para o macro, muita gente em sistemas sociais de estudo simplesmente aceitam o que lhe é empurrado goela abaixo tendo em vista que o importante é o resultado. Não se atém ao fato de que, na verdade o problema está na raiz, na teoria. Se não se aprende a pensar e questionar teoricamente tudo quanto possível, impossível corrigir algo. O prático apenas mantém as coisas funcionando. É preciso o teórico para consertá-las.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O que há de errado com o mundo. Parte 1.

Logo no início do livro, na parte I, primeiro tópico, se assim pudesse nomear, já que o próprio autor assim não o fez ao topificar, Chesterton faz uma analogia interessantíssima. Aliás analogias interessantíssimas por parte de Chesterton é falar o óbvio ululante, é o máximo do lugar comum, contudo, é assim que minha mera coloquialidade consegue expressar.

Diz Chesterton que na medicina não há muito espaço para ser criativo quando se procura resultados práticos. Segundo ele, é fácil ir ao hospital tratar de um problema na perna e voltar de lá sem ela, mas nunca você encontrará uma pessoa que vai ao hospital tratar de uma perna que volte com três pernas. Essas criatividades médicas nao cabem. O normal é o procurado. Ninguém procura ser anormal a esse ponto. 

É bom deixar claro que Chesterton é um indivíduo que teve sua obra principal no início do século XX e, especialmente esse livro "O que há de errado com o mundo" foi escrito antes de 1910. Sendo assim, essa lógica de que procuramos o normal dentro da medicina pode ter mudando um pouco de lá pra cá, afinal aberrações é o que mais vemos hoje em dia, mas o cerne da questão continua o mesmo: ninguém vai o hospital para curar uma perna e sai com três pernas. No máximo duas. Se for preciso amputar, terá apenas uma. Três nunca.

Entretanto, diz ele, no organismo social é diagonalmente o oposto o que acontece. Isso parece independer de época. Sociólogos de plantão, historiadores de fim de semana, cientistas sociais de entretenimento manifestam que se você quer ser algo, então que seja. Se você quer ser um digno consorte de um canino, que seja, afinal não sou eu que me meterei nas suas escolhas sexuais. 

O relativismo é a moda. Só que a moda é algo que vem e vai. O relativismo parece ter vindo pra ficar. É uma doença que vem, se instala e dificilmente consegue ser retirada do tecido social porque se adequa a ele, embora o ataque como uma imunodeficiência.

Hoje você acha normal um religioso não ser tão religioso assim, mas quando ele o é, o que é o normal de se acontecer, todos se espantam. Ora, se ele é religoso o que se espera é que ele seja no mínimo.... religioso. O mesmo acontece com abortistas que não quererm ser chamados de abortistas. Ora, se defendem o aborto, do que mais podem ser chamados? 

O relativismo com cara renovada de politicamente correto é algo de muito errado com o mundo, pra não fugir do título dado por Chesterton ao seu livro. 

Não poder chamar de gordo o gordo e usar de eufemismos, logicamente parece muito mais segregador do que constatar o óbvio, contudo é preciso primeiro prestar atenção na característica, identificá-la como inapropriada para depois eufemiza-la. Ora, se você simplesmente chama o gordo de gordo, basicamente está constatando. Se você para pra pensar que gordo é uma característica malquista pela sociedade, você está segregando, está discriminando. Cosntatar o lógico, que o gordo é gordo e que o preto é preto, não segrega porque é o que os olhos veem. Isso é o politicamente correto trazido pelo relativismo. Esse ponto já existia nos primeiros anos do século XX e era constatado por Chesterton não só nesse livro, mas em muitos outros. As coisas se movimentam, evoluem e infelizmente estamos nos movimentando para trás com esse infame relativismo.